quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Boi e bezerro

Terminei a semana passada com a seguinte conclusão:
“O bezerro é o destaque da semana. Estamos nos picos do movimento. A alta da reposição ultrapassou a estilingada de 2002/2003 por alguns pontinhos. Mas lá atrás, por mais forte que tenha sido a alta da arroba, foi mais ou menos aí que o mercado parou de subir. Vamos ficar de olho. Tenho a impressão que o mercado dessa semana será definitivo. Será uma semana crucial. Não sei porque estou sentindo isso. Não tem nenhuma base técnica para tal. É só um feeling.”
De fato, o bezerro é o destaque. Disparado, caro leitor. É impressionante ver a dissociação entre o mercado do boi gordo e do bezerro.
Tenho lido várias fontes desclassificando a queda do bezerro, ou a aparente falta da alta relativa ao boi como não sendo importante. Dizem que é só esperar as águas para o mercado voltar a se aquecer.
Daí o bezerro voltará a subir, dizem.
Quem sou eu para argumentar contra? Não é meu estilo bater de frente com ninguém. Prefiro analisar friamente os fatos. Não há nada na história dos preços que comprove que só pela razão de ser águas o mercado de bezerro irá subir. A história desses últimos quinze anos mostra uma coisa completamente diferente disso, aliás. Observe o gráfico.



O bezerro alternou anos de alta com anos de baixa, caro leitor. A mensagem é a seguinte, e eu já falei isso aqui antes em várias ocasiões: o bezerro quando muda de direção, ele muda por vários anos.
Quando quer subir, sobe por anos. Quando quer cair, ele cai por anos a fio também. Isso não tem nada a ver com “entrada das águas”. Para ficar mais claro o que estou querendo dizer, observe a variação ano a ano nos preços do gráfico acima colocados em forma de porcentagem.


Aqui fica bem mais claro o que quero dizer. Observe que por detrás do capô o bezerro oscila como qualquer outro mercado. Ele até perde valor alguns anos, como foi entre 1995/96 e 2005/06 e no final de 2009.
O ponto que quero chegar é o seguinte. Porque, então, tivemos essa megavalorização do bezerro entre 2006 e 2008? Sabe como é que é... Vacas produzem bezerros. A gente abateu muita vaca entre 2003 e 2007 e daí quer um milagre? Iria faltar bezerro mesmo adiante.
Foi exatamente isso que ocorreu até 2008. Mas porque o bezerro não continuou a subir depois de 2008? Porque ele está mais ou menos estável com uma ligeira queda de 2008 para cá?
Porque o que ocorreu de 2008 para cá foi uma surpreendente retenção de fêmeas.
É o inverso de 2003 a 2007, caro leitor. Agora, acredito que 2009 e 2010 foi um ano de transição entre a falta de bezerros e a entrada das novas fornadas.
Estão entrando novos animais, mas ainda não estão entrando em quantidade suficiente para derrubarem os preços, mas em quantidade suficiente para impedirem uma alta. É importante destacar essa diferença, pois de agora adiante, a cada ano, entrarão maiores e maiores quantidades de bezerros e bezerras.

E os preços? Bom, os preços, no cenário 1, oscilarão mais ou menos estáveis, com uma tendência de leve queda ainda ano que vem para começarem a cair mesmo, a meu ver, a partir de 2012. No cenário 2 eles começarão a cair já a partir de 2011 em uma agonizante, lenta e contínua queda até atingirem o final desse ciclo pecuário lá para frente.
Até agora, se considerarmos que o pico do bezerro ocorreu mesmo em 2008, o cenário 1 está sendo a realidade.

Percebe que aqui a gente extrapola, e muito, a idéia altista e circunstancial que “o bezerro sobe nas águas”? Espero que tenha ficado claro que não é assim que o mercado de bezerro funciona; é mais fácil e certeiro dizer que o mercado desse pequeno animal se move lentamente ao longo dos anos, subindo alguns anos e caindo por alguns. Ele é totalmente dependente do que acontece na evolução do descarte/retenção de fêmeas e a evolução das fêmeas também é assim.
Ou é isso, caro leitor, ou também tem o outro lado da moeda. Pode ser que você não acredite em ciclo pecuário. Fica a seu critério, mas é o mesmo que dizer que você não acredita em gravidade. Você pode não acreditar, mas isso não impede que a gravidade te arrebente no chão se você pular sem pára-quedas de um avião.

E falando em pular de avião, você viu a bolsa essa semana? Achou que eu não iria comentar, né? Fiquei enrolando até aqui falando do bezerro, não é? Na realidade não iria comentar mesmo, não, caro leitor, até porque o que ocorreu essa semana na bolsa não foi pecuária, o que ocorreu foi um clássico evento que está escrito em qualquer livro de história de mercados. Foi um choque de realidade para quem achava que as árvores cresciam até o céu. Obviamente, isso não ocorre.
Isso me lembrou Bob Farrell, ex-analista de mercado da Merril Linch, dos EUA. Cheguei a colocar no twitter essa semana: “Mercados exponencialmente em alta ou em baixa normalmente vão mais longe do que você pensa, mas eles não se corrigem andando ‘de lado’.”
“De lado”, é uma gíria de mercado. Significa um mercado que está lento, parado, oscilando pouco.
Ou seja, exatamente o oposto do que vimos essa semana no boi. Cara esperto, esse Bob.
Então, sobre a queda deixemos para lá, até porque tenho a impressão que foi exagerada demais, principalmente no contrato de novembro.

E falando em twitter, caro leitor, durante a semana tenho escrito algumas coisas por lá. Sai um bate-papo interessante, tem hora. É uma forma de ler um pouco mais sem ter que esperar até a semana seguinte por uma nova edição da CP. Entre lá e confira em twitter.com/cartapecuaria .
Estava me esquecendo, mas isso é muito importante. Vocês devem ter visto que mandei uma mensagem na quarta-feira sobre a arroba do boi encostando na arroba do bezerro essa semana. Para quem não teve tempo de abrir a mensagem coloco novamente aqui o gráfico.



Isso realmente é uma coisa que a gente tem falado muito aqui faz tempo. O teto do boi é o bezerro, e mais uma vez parece que essa máxima está se mantendo, se olharmos para a movimentação dos preços essa semana.
Foi só o boi encostar no bezerro para o mercado fraquejar. Agora, este ano tivemos um preciosismo — as duas arrobas se encostaram exatamente no mesmíssimo preço, R$116,41/@. Isso é impressionante e curioso, só isso. Não é para se tirar nenhuma conclusão a não ser alegórica desse fato.

O teto do boi é o bezerro, e isso quer dizer que ao redor da arroba do bezerro o boi fez seu pico. Ao redor, ok? O que ocorreu essa semana foi a primeira vez que isso novamente aconteceu desde 2007.

Seguindo em frente, temos aqui do lado novamente o gráfico das escalas de abate. Dessa vez peguei uma média das escalas Brasil afora, e não a escala de SP, medida pelo indicador Esalq/BVMF. Queria nessa semana dar uma olhada geral em como estão as coisas pelo Brasil. Observe aqui de fato as escalas terem andado um pouco mais nessa semana. Saímos de 4 e fomos para 6 dias, em média. Para uma situação que vinha entre 4 e 7 dias desde junho, olhando sob essa perspectiva realmente se compraram mais bois esses últimos cinco dias.


Compraram-se muito bois no MS, de novo. Olha o MS aí como venho falando essas últimas semanas. Um leitor chamou a atenção para as escalas em Rondônia também. Um pecuarista me falou que as escalas andaram bem no sudoeste do Mato Grosso e um frigorífico me disse que comprou bem em São Paulo. Ou seja, essa semana foi ofertada uma boa quantidade de animais.
As escalas, conforme a gente pode ver no gráfico, não podem romper essa linha vermelha. Se romperem, aí meu amigo, é porque está entrando mais animais mesmo e é bom ficar preparado.

FONTE: SCOT CONSULTORIA/AUTOR ROGÉRIO GOULART

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