quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

REGRAS CLARAS PODEM EVITAR SOBRESSALTO NOS PREÇOS DA CARNE

AJUDARIA MUITO O SETOR PRODUTIVO SE AS REGRAS FOSSEM CLARAS. UM NOVO GOVERNO É UMA EXCELENTE OPORTUNIDADE PARA REGULAR A CADEIA DA CARNE

Pecuaristas, frigoríficos e consumidores foram bastante afetados -positiva e negativamente- pelo mercado da carne bovina em 2010.
Os criadores festejaram o aumento da arroba do boi, que chegou perto de R$ 120 e depois caiu para R$ 110.

Trata-se de excelente remuneração nominal, que ultrapassou US$ 60, algo jamais visto na atividade.

Porém, isso não significa que o setor produtivo não tenha enfrentado problemas.
Os custos diretos e indiretos aproveitaram o bom momento do boi e também subiram, pressionando a rentabilidade nas fazendas. Os frigoríficos viveram dois momentos. A primeira parte do ano foi mais tranquila, com oferta de gado e demanda por carne equilibradas.

Mesmo com ociosidade de até 50% em alguns momentos, o segmento recuperou parcela das exportações perdidas -por conta da crise em 2009- e respirou bem.

No segundo semestre, o mercado mudou a partir da elevação dos preços do boi gordo. Nesse momento, a indústria certamente se arrependeu da pressão imposta nos últimos anos à classe produtora, o que elevou o abate de fêmeas a níveis históricos.

Resultado: o aquecimento da demanda no varejo e a elevação do preço da arroba no campo, por conta da escassez de animais, pressionaram os frigoríficos, que tiveram de desembolsar mais recursos para adquirir o gado -até porque cresceu o movimento de pagamento à vista.

Toda essa complexidade da cadeia explodiu no colo do consumidor. Em outros anos, com a economia mais estável, os preços da carne bovina mantiveram-se em patamares moderados.

O mesmo não ocorreu neste ano -especialmente na segunda metade-, com o produto atingindo cotações salgadas, com evolução na casa de dois dígitos.
A pecuária é uma atividade de ciclos. Isso é histórico e não há como mudar sua trajetória, uma vez que vários agentes atuam simultaneamente e há complicadores externos, como o clima.

É o que acontece na Austrália, país que enfrentou sérios problemas de estiagem nos últimos anos. Bom para os exportadores brasileiros, que ocuparam espaços no comércio internacional.
Desta vez, fomos nós que enfrentamos situação inesperada. A demanda evoluiu bem mais do que o esperado e a oferta de gado para abate não foi suficiente para atender às necessidades internas e externas.

Há uma lição a ser aprendida? Sempre há. A pecuária é um negócio emocional.
Não deveria ser, mas é.
São necessários mais de dois anos para ter um boi gordo pronto para abate. Só de gestação, são nove meses.

Isso significa que os bovinos nascidos hoje estarão no peso ideal somente a partir da segunda metade de 2012.
E não dá para imaginar que nesse momento a cotação da arroba será a mesma de hoje.
Seria bom se fosse, mas não é assim que funciona.

O frigorífico está com ociosidade atualmente, mas pode não estar lá na frente e, dessa forma, será menos flexível no preço a pagar. Isso é o mercado.
Ajudaria muito o setor produtivo se as regras fossem claras. Investir hoje em genética de qualidade, em alimentação diferenciada, em controles sanitários e em mão de obra sabendo qual será a receita em dois anos seria um indicativo de profissionalismo da atividade.

Como um novo governo assume, está aí uma excelente oportunidade para regular a cadeia da carne bovina.
Isso dará melhores condições de investimento ao pecuarista, sabendo que as regras definidas serão cumpridas, assim como definir algumas ferramentas de proteção do negócio. É pedir demais?

Veículo: Folha de S.Paulo

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