terça-feira, 17 de julho de 2012

Sebo bovino - Direto para o tanque



Mesmo com problemas, o uso da matéria-prima já responde por 9% a 15% da produção de biodiesel, contribuindo para o aumento da produtividade
Num país que possui o segundo maior rebanho bovino do mundo, a cadeia do biodiesel, hoje, tem aproximadamente 80% da sua produção advinda da utilização do óleo de soja, principalmente no Centro-Oeste, Sudeste e Sul, impulsionada pelo Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) a partir da agricultura familiar e da negociação do biodiesel por leilões. Entretanto, o sebo bovino está sendo, cada vez mais utilizado, é o segundo no ranking na produção de biodiesel. Outras matérias-primas empregadas, embora, com menos intensidade, são a palma e a mamona, nas Regiões Nordeste e Norte, além do babaçu e do algodão, por exemplo. 
Ocupando papel relevante na cadeia do biodiesel, o sebo bovino mostra índice de 9% a 15% na produção do combustível renovável, podendo até mesmo aumentar sua eficiência, segundo pesquisa sobre a inserção desse produto na produção industrial do biodiesel do economista Gabriel Levy, da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" (USP/Esalq) em Piracicaba, orientada pela professora Márcia Azanha Ferraz Dias de Moraes, do Departamento de Economia, Administração e Sociologia (LES) da Universidade de São Paulo (USP).
O trabalho visou compreender os problemas da agroindústria do biodiesel, especificamente no que se refere àquelas indústrias que usam o sebo. Assim, Levy tratou de descobrir a significação dos diversos aspectos da utilização desse material de origem bovina que resultariam numa maior eficiência dentro da cadeia do biodiesel, além de averiguar se a administração da integração vertical é apropriada para o setor.
O sebo bovino, conforme o economista, tem até 93% de aproveitamento na produção do biodiesel, e o seu custo é baixo, já que, vale lembrar, o Brasil possui o segundo maior rebanho bovino do mundo. Em 2009, a participação desse produto na cadeia produtiva do biodiesel foi cerca de seis vezes maior do que a soma do uso da mamona e da palma.
Oito usinas de biodiesel que utilizam o sebo bovino como matéria-prima, em que duas são verticalizadas e as restantes que têm fornecimento de matéria-prima por transações frigoríficos/graxarias, foram estudadas pelo programa de pesquisa, que buscou, à observação do campo, apresentar a percepção dos produtores por meio de questionários e responder cinco hipóteses: o sebo bovino é um ativo específico; a mensuração dos atributos do sebo bovino é custosa; a normatização dos atributos técnicos da matéria-prima pode modificar a estrutura de mercado do sebo bovino e a governança do biodiesel; a criação de um selo ambiental para o uso da gordura no biodiesel aumentaria seu uso como matéria-prima; os ganhos de escala existente na produção do biodiesel induzem à verticalização para trás entre frigoríficos e usinas de biodiesel.
Por ser um ativo com qualidade constitutiva e características técnicas e físicas, esta última dada à cristalização do sebo a temperaturas inferiores a 12 graus durante o inverno, e para não arcar com perdas, muitas usinas compram o insumo em pequena escala, como atesta o economista em sua primeira hipótese. Observou-se primeiramente a necessidade de adaptações sobre o modal de transporte utilizado para o sebo entre frigoríficos/graxarias e as plantas do biodiesel, sendo que as características do veículo influenciam na qualidade do biodiesel, e a evidência de que a distância não representa agregação de custo de transação, quando a origem é o sebo bovino, para os produtores de biodiesel. 
Na hipótese dois, implica-se que a mensuração dos atributos desse material seja “custosa”, visto a necessidade de purificação da matéria-prima antes da transesterificação, afirmando o problema de heterogeneidade dos lotes fornecidos e a dificuldade de mensuração do nível de acidez, conforme alertado pelos entrevistados de Levy. Assim, “os custos de mensuração das propriedades físico-químicas do sebo bovino seriam altos”, relata o economista. Mas para reduzir os custos de mensuração, deve-se alinhar a normatização, para a produção do biodiesel, dos atributos técnicos do sebo. Isso, com a proposição verificada pela Teoria dos Custos de Mensuração (TCM) acerca da padronização de atributos. Fato que teria, como consequência, a abertura de meios para a geração de concorrência perfeita.
Na hipótese três, vê-se que os produtores respondem positivamente quanto à criação de normas técnicas para o sebo, condicionando os fornecedores a um melhor padrão de qualidade e impulsionando a estruturação do mercado de matéria-prima, o que levaria a melhores condições para o funcionamento de um mercado aberto. Hoje, no que diz respeito a uma transação adequada para esse material, o que dificulta a existência de um mercado relativamente organizado é a falta de um selo de qualidade que considerasse a produção de um sebo ideal.
O grupo frigorífico JBS, por exemplo, pode ilustrar o interesse de outros frigoríficos pela utilização do sebo bovino na produção do biodiesel, como relata Levy, visto que, além de já utilizar a matéria-prima na indústria de higiene e cosméticos, investiu R$ 42 milhões em uma planta de biodiesel, em Lins (SP), capaz de gerar 110 milhões de litros por ano.
Certificação
ambiental para
a matéria-prima
Os pontos fortes da utilização do sebo bovino na produção de biodiesel detectados pelo economista Gabriel Levy nessas usinas se destacam pelo largo aumento da produtividade sem a concorrência com a cadeia de alimentos, sendo uma das formas de diversificar as fontes de matéria-prima e por ser um meio ambientalmente mais adequado de destinação do resíduo. 
Entretanto, “a empresa Biocapital adquiriu sebo do frigorífico Quatro Marcos de Juara (MT) em 2008. Arrendado pelo Grupo JBS, o frigorífico teve suas atividades embargadas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) por operar sem a devida licença ambiental, e o fornecimento para a Biocapital foi interrompido”, relata Levy.
Assim, vê-se que os sintomas da falta de um mercado organizado têm como pontos negativos: problemas na aquisição da matéria-prima, com a má comunicação entre a cadeia produtiva do sebo e a do biodiesel; as variantes do preço do produto e a qualidade da matéria-prima, que pode dar como resultado custos adicionais aos produtores de biodiesel. Além disso, essas variantes podem ser, tanto para a regularidade quanto para a expansão da oferta do biodiesel a partir do sebo, fatores limitantes, considerando ainda que essa matéria-prima possa apresentar até 85% dos custos de produção do biodiesel. Levy explica que “a maior consequência desse problema é a geração de um combustível de má qualidade”.
Para isso, deve haver a padronização da matéria-prima e da extensão do selo social, respondendo à quarta hipótese. E para promover, uma vez que o sebo não está inserido no Selo Combustível Social, a coordenação entre os autores do ato transacional, deve-se produzir uma certificação ambiental para o sebo bovino. Criando, portanto, o Selo Ambiental e/ou Selo Combustível Social para a matéria-prima, incluindo os pequenos pecuaristas, aumentando o uso da gordura no biodiesel e, consequentemente, a escala produtiva do combustível. Já que, uma das principais características do PNPB, por meio do Selo Combustível Social criado pelo governo federal, é o cumprimento de um papel social.
Com essa construção de regência e com os ganhos de escala existente na produção do biodiesel, a integração vertical para trás, ligando os elos entre frigoríficos, graxarias e usinas de biodiesel, seria a melhor forma de administração para esse setor e poderia, também, promover a variedade de matérias-primas, assim como diminuir as emissões de gases poluentes. 
Pela periodicidade da demanda por sebo bovino na produção do biodiesel devido aos fatores climáticos sazonais em relação às baixas temperaturas, assim como as especificidades físicas e temporais, como perecibilidade, acidez e risco de cristalização, a quinta hipótese fora rejeitada por Levy, visando que, por causa desses fatores, as economias de escala no processo de produção do biodiesel não podem ser plenamente obtidas. 
Entretanto, “a verticalização representaria um meio de reduzir os riscos associados à baixa qualidade do material, como também diminuir custos vinculados à informação sobre o produto. Nesse sentido, a questão relacionada à informação justifica a percepção de que a integração vertical possa ser a configuração mais apropriada, uma vez que internalizaria as transações e reduziria os problemas relativos ao fornecimento”, diz o economista. Além disso, a obtenção de créditos de carbono por meio do sebo pode estimular a verticalização entre usinas e frigoríficos/graxarias tanto para o abatimento de suas emissões quanto para geração de receitas.


Por: Alanna Sartori Messora


FONTE: REVISTA SAFRA
http://www.revistasafra.com.br

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