terça-feira, 8 de janeiro de 2013

ANGUS, a polêmica do sêmen importado e alguns pontos nos “is”


Por Fernando Furtado Velloso
Med. Vet., Inspetor Técnico da ABA e Diretor da Assessoria Agropecuária FFVelloso & Dimas Rocha
Em função de recente notícia publicada no Jornal Correio do Povo em (31/12/2012), intitulada de “ABA quer controle sobre sêmen˝, foi retomada a discussão sobre o uso massivo de produto importado no mercado brasileiro. Na referida nota, o material importado foi qualificado como “restolho˝ e aqueceu os ânimos das empresas e criadores envolvidos no setor. Provocações e folclores a parte, vou tentar neste texto apresentar alguns dados e considerações que podem contribuir com esta discussão importante e necessária. Vou tentar por alguns pontos nos “is˝.
A raça Angus tornou-se nos últimos 15 anos como a principal vendedora de sêmen entre as raças europeias e chegou a patamares inimagináveis para muitos. Em 2000, o Angus vendeu 1 milhão de doses no Brasil em um mercado de menos de 4 milhões de doses, ou seja mais de 25% de market share.
Em 2011, a marca superou os 2,3 milhões de doses em um total de aproximadamente 7 milhões de doses, ou seja, mais 30% de todo o bolo. Nestes últimos 10 anos o mercado de IA cresceu muito e a importância da raça acompanhou este comportamento.
Para 2012, a expectativa é de mais de 3 milhões de doses para o Angus e esta informação indica mais um ano de grande crescimento e de maior participação no mercado.
Atribui-se estes resultados positivos para a raça uma combinação de fatores: intensificação da pecuária através de programas de cruzamento, demanda por animais cruzados pelos confinamentos, remuneração diferenciada de animais Cruza Angus pelos frigoríficos, forte demanda por carne de qualidade no mercado doméstico, crescimento do Programa Carne Angus Certificada e dos diferentes programas e marcas de carne, etc.
Gráfico 1: Evolução da Inseminação Artificial no Brasil (cedido pela ABS Pecplan)
Gráfico 2: Venda de sêmen Angus no Brasil. Nacional x Importado (cedido pela ABS Pecplan)
Este cenário é muito bom para a pecuária brasileira e deveria animar muito os criadores de Angus no Brasil, porém a situação tem gerado desgaste e até polêmica entre os produtores de genética, pois o sêmen vendido na maioria é estrangeiro e não contribui para o PIB do Angus brasileiro. De acordo com a ASBIA, 69,4% do sêmen de Angus vendido no Brasil em 2011 é importado e 30,6% nacional.
Na fatia de produto importado o principal fornecedor é os Estados Unidos e é fácil compreender por que:
a) as principais empresas de inseminação no Brasil são americanas ou tem unidades neste país (ABS, ALTA, CRI, Select Sires, etc);
b) o Estados Unidos é o principal país na produção de genética Angus no mundo, tendo o maior volume de animais e a tecnologia mais desenvolvida em programas de seleção, etc. A avaliação genética americana é poderosa e volumosa em dados e esta condição traz argumentos técnicos e comerciais que favorecem a venda. Mesmo touros jovens e de baixa acurácia são vendidos em nosso mercado, mas com a justificativa e respaldo da solidez do programa de seleção.
Naturalmente o produtor brasileiro de genética Angus está desconfortável com esta condição, mas vivemos uma situação contraditória, pois os próprios criadores de gado puro usam preferencialmente sêmen importado. No Sumário de Touros Angus 2012 (PROMEBO) estão 746 reprodutores listados e somente 219 são nacionais, ou seja, somente 29,3%. Sendo assim, no gado puro é usado o mesmo % de genética importada que no gado comercial (cruzamento). Curioso: reclamamos que pouco se vende genética nacional, mas nem nós mesmos usamos com confiança o nosso produto.
Na condição de Técnico e entusiasta da raça, sou um defensor da genética nacional e trabalho para a mudança deste cenário, pois entendo necessário maior equilíbrio entre a participação de produto importado e nacional. Tenho esta posição não por motivos ideológicos, paixões ou interesses próprios, mas por acreditar embasado em informações técnicas que a genética produzida aqui tem diferenciais em relação à importada.
Para justificar minha posição com dados técnicos apresento os Touros Líderes no Sumário 2012. Nestes grupos estão os 20 melhores touros para diferentes características no Brasil e encontramos o seguinte:
  1. 30% dos Touros Líderes para Índice Final são nacionais;
  2. 60% dos Touros Líderes para Índice Desmame são nacionais;
  3. 35% dos Touros Líderes para Índice Carcaça são nacionais;
  4. 75% dos Touros Líderes para Pelame na Desmama são nacionais;
  5. 70% dos Touros Líderes para Índice Carrapato são nacionais;
Estas informações são muito animadoras, pois apesar da baixa participação dos touros brasileiros em nosso sumário (menos de 30%), temos um rankeamento muito positivo destes pais e com destaque para características de adaptação (pelo e carrapato) que são muito relevantes em nosso país e para os usuários de genética Angus no Brasil, seja em base taurina ou zebuína.
Outro argumento tecnicamente sustentável é que a nossa seleção ocorre em condições de ambiente e produção similares ou próximas as do nosso usuário. É inegável a Interação Genótipo Ambiente, e de forma simplificada pode-se dizer é que o desempenho de animais pode mudar grandemente quando estes são selecionados em um ambiente e usados (ou multiplicados) em outro. Esta situação é comprovada por touros que mudam significativamente de posição (ranking) entre o sumário do país de origem e sua posição no sumário brasileiro. Desta forma, para os rebanhos brasileiros a lógica indica que a melhor genética é a selecionada aqui, desde que dentro de critérios técnicos e com técnicas objetivas de melhoramento animal.
Não creio que impor restrições artificiais à importação de sêmen seja uma alternativa saudável, pois o mercado é o melhor regulador disponível. Haja vista os recentes maus exemplos da Argentina com a exportação de carne e o desmonte da pecuária daquele país.
Os critérios usados pelo MAPA para liberar a importação de material genético são simples, mas objetivam que somente ingressem animais com genética positiva, ou seja, superior à média do país de origem.
No caso do Brasil, temos diversos reprodutores em centrais que atendem a este quesito, outros oriundos de exposições e outros nem testados do ponto de vista da performance. Logo, não podemos afirmar que o material importado é na média inferior ao nacional.
A discussão deste tema (genética importada ou nacional) traz reflexões importantes e é devida a preocupação com a genética que utilizamos. Temos pela frente desafios e respostas que nos cobram os produtores: informação do desempenho da genética Angus em cruzamento, touros com melhores resultados em IATF, touros que atendam as exigência da nossa indústria frigorífica.
Enfim, temos um imenso mercado nos aguardando e aquele que for mais competente em ofertar o melhor produto ocupará mais espaço, seja com material importado ou nacional.

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