sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

O futuro do Mercado da Carne

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Nos anos de 90, quando ingressei na faculdade de Medicina Veterinária, ninguém falava de carne de qualidade no Brasil. Havia poucas iniciativas, como o Novilho Zaffari, pioneiro na década de 70, e outros casos pontuais, mas de fato, o assunto nem era comentado nos congressos e eventos que participava. Carne de qualidade era carne Argentina ou Uruguaia e ponto final, fazer churrasco já era um luxo em si.
A economia do Brasil teve um grande salto com o advento e maturidade do plano real. Os brasileiros passaram a buscar alternativas de qualidade em termos de alimentação e produtos premium. E deste período em diante praticamente tudo mudou, em especial o consumidor, o mercado e as ameaças.
O consumidor evoluiu de forma surpreendente neste período. Tornou-se mais exigente e informado, usando a internet para conhecer, comparar produtos e preços e, especialmente, opinar sobre eles, influenciando de forma ativa o consumo de seus pares, com muito mais contundência que as mais sofisticadas estratégias de publicidade comercial. Surgiram produtos premium em diferentes segmentos considerados commodities como café, arroz, leite e a carne, que passaram a disputar a atenção nos cardápios de restaurantes, gôndolas de supermercado e, é claro, na tela dos smartphonesconectados 24 horas por dia às redes sociais. A palavra qualidade em si passou a tomar dimensões que jamais imaginaríamos nos anos 90, e o consumidor passou a exigi-la, sem clemência, 365 dias por ano.
Em paralelo a esta evolução de paladar e costumes, o nível de exigência quanto ao bem-estar animal, responsabilidade social e ambiental e os movimentos contrários ao consumo de proteína de origem animal avançam de forma acelerada, assim como a busca por fontes alternativas de proteínas, capazes de alimentar a população estimada de 9,8 bilhões de habitantes em 2050. A carne de laboratório, a carne vegetal e a alimentação a base de insetos serão realidades muito próximas já nos próximos 5 anos, acredite!
O mercado da carne tomou dimensões globais. Tive a oportunidade de navegar por mercados como Europa, Ásia e Oriente Médio e perceber o enorme potencial para carnes premium, e que em todo o mundo, quando se fala em carne de qualidade diferenciada está se falando em Angus. Na China, por exemplo, estima-se um número de mais de 200 milhões de consumidores ávidos por marcas de luxo e produtos de alta qualidade, o que abre um verdadeiro oceano de oportunidades para a carne Gourmet brasileira. As indústrias já estão se preparando para aterrissar neste mercado utilizando plataformas de e-commerce em modelos de negócio inimagináveis em nossa sociedade atualmente.
No Brasil, estima-se um mercado potencial de mais de 200 mil toneladas de carne gourmet por ano. Entretanto, menos de 40% deste potencial está sendo atendido, o que permite um crescimento consistente para os próximos anos. Contudo, a cadeia produtiva precisa encarar o desafio da produção escalonada 12 meses por ano, o maior entrave ao desenvolvimento e escalada dos preços e premiações para animais de qualidade. A sazonalidade de oferta de novilhos no segundo semestre do ano prejudica a cadeia produtiva, afetando preços e margens de comercialização, limita a expansão de pontos de venda, contratos de exportação, crescimento das premiações, etc. Quem quer qualidade, e paga por ela, exige o mesmo padrão o ano todo!
O produtor brasileiro precisa estar preparado, qualidade deixou de ser diferencial e passa a ser uma obrigação. O que chamávamos de carne qualidade em um mercado sem concorrência e absolutamente carente de opções, hoje, pode ser considerada apenas commodity. As dimensões do que se considera um produto de qualidade mudaram. Uniformidade e maciez, hoje, são o mínimo que se exige, aroma e sabor também são considerados, além do desejado marmoreio. A rastreabilidade, é uma tendência irreversível que chegará a carne bovina, muito além da simples exigência do mercado Europeu.   
A indústria precisa evoluir. Transparência, “compliance” e rastreabilidade são fundamentais, assim como avançar em tecnologia de carnes, rotulagem adequada e informativa, embalagens, porcionamento, integração ao varejo e food services. É incrível como itens tão antigos como a tipificação de carcaças e maturação estão tão atrasados no Brasil.
Todavia é no relacionamento entre os diferentes elos da cadeia produtiva que temos maior urgência e que teremos os melhores resultados. A qualidade da carne vem do campo, a oferta de animais com bom padrão 12 meses por ano vem essencialmente do trabalho do produtor, assim como a rastreabilidade. Os pecuaristas precisam entender o “negócio carne bovina”. A indústria, de sua parte precisa abrir suas portas para um diálogo franco com seus fornecedores e investir em transparência e tecnologia.
A boa notícia é que a mudança já começou. O Programa Carne Angus é um dos exemplos de sucesso de integração, qualidade e visão de cadeia produtiva. Tornou-se o maior programa de qualidade do Brasil, ocupando uma fatia importante do mercado de carnes gourmet e envolvendo produtores de norte a sul do Brasil. O desafio é aprofundar este modelo e trabalhar de forma ainda mais integrada com as indústrias, aproximando o produtor e, lado a lado, serem protagonistas do futuro da cadeia produtiva. 

*Artigo publicado no Anuário 2018 da Associação Brasileira de Angus
Flavio Schuler Medeiros

Em volume, exportações de carne bovina bateram recorde em 2018, diz Abrafrigo

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As exportações totais de carne bovina (in natura e processada) bateram o recorde estabelecido em 2014, de 1 milhão 560 toneladas movimentadas, alcançando um volume de 1 milhão e 639 mil toneladas exportadas no balanço geral de 2018, informou a Associação Brasileira de Frigoríficos (ABRAFRIGO)
Em valores, porém, a receita obtida de US$ 6,5 bilhões ficou abaixo dos US$ 7,2 bilhões obtidos em 2014, ano de melhores preços para o produto brasileiro. A entidade divulgou estes números com base nos dados fornecidos pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), através da SECEX/DECEX. Segundo a ABRAFRIGO, para 2019 a expectativa é de que estes volumes cresçam pelo menos 5%, com o retorno as compras da Rússia, que em 2017 havia importado 150 mil toneladas em 2018 e restringiu suas compras a 7 mil toneladas em 2018. Em relação a 2017, quando o Brasil exportou 1 milhão 485 mil toneladas, a movimentação de 2018 cresceu 10%, enquanto que a receita aumentou 8%. No último mês do ano, as vendas foram de 153 mil e 69 toneladas e a receita de US$ 577 milhões, crescimento de 12% no volume e de 3% nas divisas. O aumento das compras por parte da China compensou a ausência dos russos: foram 150 mil toneladas a mais em 2018, com o país importando pela cidade estado de Hong Kong e pelo continente 43,8% da comercialização brasileira do produto contra 38,2% em 2017. Foram 717 mil 492 toneladas contra 567 mil 638 toneladas em 2017. O Egito aumentou suas aquisições em 18% ficando na segunda posição entre os países importadores, com 181.097 toneladas; em terceiro lugar veio o Chile, com crescimento de 77% na sua movimentação que atingiu 114 mil 944 toneladas. Além da Rússia, Irã e os Estados Unidos tiveram queda significativa nas suas importações, de 40% e de 16%, respectivamente. Entre os 20 principais destinos, o Uruguai foi o que mais se destacou percentualmente, com crescimento de 202%: de 4 mil toneladas movimentadas em 2017 saltou para 14 mil toneladas em 2018. São Paulo foi o estado que mais movimentou a carne bovina brasileira para destinos no exterior, com 399 mil 543 toneladas (24,4%); em segundo lugar ficou o Mato Grosso, com 301 mil 538 toneladas (18,4%); na terceira posição está Goiás, com 236 mil e 187 toneladas (14,4%). Rondônia ficou na quarta posição, com 167 mil e 578 toneladas; Mato Grosso do Sul em quinto, com 153 mil 568 toneladas e Minas Gerais em sexto com 147.094 toneladas.
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