MARCELO BELEDELI/ESPECIAL/JC
Com a ajuda do clima, principais culturas apresentam bons índices de produtividade
Depois de amargar grandes perdas financeiras em 2012, devido a problemas climáticos que afetaram as lavouras gaúchas (seca no verão, granizo e geada no inverno) os produtores do Rio Grande do Sul estão, nesta safra, colhendo bons resultados econômicos. Com a ajuda do clima mais favorável, as principais culturas de grãos (soja, milho e arroz) apresentam bons índices de produtividade no Estado.
No total, conforme a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), são esperadas 25,55 milhões de toneladas destes três produtos. Além disso, os preços pagos aos agricultores, mesmo tendo apresentado uma redução com a entrada da safra, ainda se mantêm acima da média histórica.
Esses dois fatores combinados estão gerando uma expectativa de lucro para os produtores do Estado em 2013, especialmente na soja. “Temos uma supersafra que está acontecendo depois de secas na América do Sul e nos Estados Unidos, que diminuíram os estoques mundiais e aumentaram os preços internacionais dessa commodity. Combine isso com uma demanda crescente, especialmente na China, e a tendência é de que o ano deve ser muito bom para os produtores”, destaca Maria Flavia Tavares, coordenadora do Núcleo de Estudos do Agronegócio da regional gaúcha da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM Sul).
Conforme estimativas da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), a safra de verão deve gerar um faturamento de R$ 30 bilhões no Estado. “Podemos afirmar que este é um ano em que é muito provável que a maioria dos produtores terá lucro”, comenta Antônio da Luz, economista da Farsul.
No entanto, a entrada de receita com a safra também gera uma preocupação: o que fazer com o dinheiro? O investimento nas propriedades é uma prioridade apontada pelos analistas. “Não tem como não fazer investimento, ou o agricultor investe em sua área ou para a atividade. Essa é uma realidade, pois o trabalho agrícola hoje está muito tecnológico”, destaca Luz. Essa necessidade também é destacada por Maria Flávia, a fim de garantir lucros futuros. “Neste ano, os preços estão bons. Mas ano que vem podem não estar. Está aumentando muito a oferta, especialmente de soja, e a tendência será de queda. Estão, se os produtores não investirem agora na propriedade para ter aumento de produtividade, eles terão problemas na frente.”
Uma das vantagens que os produtores possuem para realizar investimentos em várias áreas (compra de máquinas e equipamentos, construção de silos e armazéns, instalação de sistemas de irrigação, etc) é a ampla oferta de linhas de financiamento com prazos e juros vantajosos, como Finame PSI (Programa de Sustentação do Investimento), Pronaf Mais Alimentos, Pronamp e Moderinfra. Esses fatores já têm incentivado as vendas. Em março, durante a última edição da Expodireto Cotrijal, maior feira de máquinas e equipamentos do Estado, foram realizados R$ 2,5 bilhões em negócios, 128% a mais que no ano anterior.
Entretanto, segundo Luz, os produtores precisam ter cuidados antes de tomar a decisão de investir. É necessário planejar as reais necessidades de cada gasto, e verificar o que deve trazer mais retorno para o agricultor. “Não compre porque está barato, ou porque o juro baixou. Compre conforme a necessidade que tiver, dentro de uma lógica planejada”, alerta o economista.
Dicas de investimentos
Dívidas
- O pagamento de dívidas deve ser considerado prioritário pelos agricultores. “Não se pode especular com dívida. Livre-se delas e depois planeje o que fazer”, destaca Roberto Bergamini, proprietário da Fazenda Bergamini, de Quatro Irmãos. Conforme a Farsul, a principal recomendação aos produtores endividados é que façam os pagamentos que já estavam programados para o ano e, se possível, antecipem parcelas futuras. No entanto, não devem direcionar todos os recursos ganho para pagar o endividamento. “Mesmo que fizessem isso, geralmente é insuficiente para cobrir todo o montante, e deixa-se de aplicar no aumento da produção”, explica o economista Antônio da Luz.
Compra de terras
- Investimento para quem tem perfil mais conservador e patrimonialista e possui grandes recursos. O retorno é muito mais demorado do que aplicar no aumento da produção. Para analistas, a longo prazo é interessante, devido a tendência mundial de elevação nos preços das terras. No Estado os valores já estão inflacionados: um hectare na zona de grãos de Passo Fundo chega a custar R$ 22 mil, conforme a Scot Consultoria. Em comparação, no cerrado do Piauí, onde se expande a produção de soja, podem ser encontradas terras por R$ 4 mil o hectare. No entanto, esses locais necessitam grandes investimentos de infraestrutura e formação de lavoura.
Armazenagem
- Diante da queda dos preços dos grãos e o aumento do valor do frete que ocorrem durante o auge da safra, estocar a colheita para vendê-la no futuro com condições mais vantajosas é uma alternativa interessante para os produtores. Além disso, elimina o pagamento das taxas decorrentes da classificação dos grãos, no momento da armazenagem com terceiros. Existem linhas de crédito disponíveis através do Moderinfra, Finame PSI, Pronaf e Pronamp, entre outros. No entanto, o produtor deve estar alerta para os custos de manutenção das estruturas, como energia elétrica, conservação controle de pragas, de umidade e manejo dos equipamentos.
Maquinário
- A compra de máquinas agrícolas avançou muito nos últimos anos, com linhas de crédito de taxas de juros reduzidas e longos prazos, como Finame PSI e Pronaf Mais Alimentos. Embora muitos produtores já tenham trocado seu maquinário antigo, o interesse por novos equipamentos tem subido. Apenas em março, as vendas no Brasil cresceram 18% sobre fevereiro e 38% sobre o mesmo mês de 2012, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Mas os analistas recomendam cautela antes de adquirir um novo trator ou colheitadeira. “Não compre porque está barato, ou porque o juro baixou. Compre conforme a necessidade que tiver”, alerta Antônio da Luz.
Irrigação
- A irrigação é sempre destacada como uma prioridade para o setor primário do Estado. O uso de equipamentos que forneçam água constante para as lavouras garante de uma boa produtividade e de renda mesmo com o clima adverso, com retorno rápido do investimento. A instalação de um pivô, por exemplo, pode pagar o gasto dispendido em até cinco anos. No entanto, os produtores ainda tem que enfrentar processos lentos e burocráticos para conseguir a liberação ambiental dos órgãos governamentais e o fornecimento de energia trifásica das distribuidoras de eletricidade, o que tem causado atrasos na implantação mais efetiva da irrigação nas propriedades gaúcha.
Melhoria de solo
- A base do aumento de produtividade é a fertilidade do solo. Devido à acidez da terra em grande parte das áreas produtoras, a correção através de aplicação de calcário e outros produtos é uma necessidade constante. Uma recomendação para quem está vendendo a safra é aproveitar o lucro para comprar com antecipação os insumos para a próxima lavoura, evitando a alta dos preços. Além disso, analistas e produtores recomendam que os agricultores busquem tecnologias de agricultura de precisão, para identificar as reais necessidades de correção de solo em cada área de sua propriedade, otimizando, dessa forma, os gastos feitos para a melhoria das condições de fertilidade.
Fontes: SCot consultoria, bb, simers, farsul e produtores rurais
Pagamento de dívidas deve ser prioridade
Apesar da expectativa de boa remuneração com a safra, grande parte do lucro dos produtores gaúchos já tem destino definido: o pagamento de dívidas. “Ano passado tivemos perdas em torno de 50% da produção devido à seca. Com faturamento dos outros 50%, o agricultor não conseguiu nem pagar os custos de produção, uma vez que a margem de lucro geralmente fica entre 10% e 20%”, destaca Antônio da Luz.
Somente devido às perdas na produção de 2012 com a seca, os agricultores do Rio Grande do Sul acumularam um total de R$ 6 bilhões, dos quais R$ 5 bilhões foram reequalizados para pagamento em um prazo de até 10 anos. “Isso deu condições para que os produtores possam pagar a parcela que vence neste ano com tranquilidade”, afirma o economista. A recomendação da Farsul é que, neste ano, os produtores paguem os 10% da dívida que acumularam e sejam comedidos nos investimentos, fazendo apenas gastos que estavam planejados.
A necessidade de destinar o lucro da atual safra para pagar prejuízos das lavouras de 2012 é uma preocupação para os produtores e engenheiros agrônomos Volnei Cecconello e Luciano Remor, de Ipiranga do Sul, na região do Alto Uruguai. Juntamente com o irmão de Volnei, Mateus Cecconello, eles plantam, em sociedade, cerca de 500 hectares, entre terras próprias e arrendadas. Na lavoura de inverno, devido a fatores climáticos tiveram um prejuízo de R$ 45 mil em 150 hectares de trigo e cevada. Outro revés, de R$ 163 mil, foi nos 120 hectares que haviam sido plantados com milho, que foi totalmente perdido. “Ainda temos que pagar o custeio de trigo e cevada, e tivemos que tirar do bolso o custeio de milho. Agora toda a lucratividade da soja vai ter que ser destinada para cobrir isso”, afirma Cecconello.
A expectativa de produtividade para a lavoura dos sócios é de R$ 65 sacos por hectares. Conforme Remor, o valor mínimo que poderá ser vendida a colheita para garantir o equilíbrio das contas é R$ 50,00 o saco. “Com isso a gente teria uma receita de R$ 3.250,00 por hectare. Nosso custo de produção, contando cobertura, tratamento, transporte, chega a R$ 1.200,00 por hectare. Dessa forma teríamos um lucro de R$ 2.050,00, o que garante o pagamento das contas, mas é o mínimo que precisamos receber devido a todas as frustrações que tivemos por causa de uma única noite de clima desfavorável.”
Armazenagem e irrigação são necessidades no Estado
Rodrigo Bergamini comemora produtividade nas lavouras de soja e milho.
MARCELO BELEDELI/ESPECIAL/JC
Dentre as opções de investimento na propriedade, as que deveriam ter o desenvolvimento mais urgente no Estado, de acordo com a Farsul, são irrigação e armazenagem. A primeira é ferramenta importante para o aumento de produtividade das lavouras, enquanto a segunda fornece garantia de melhor condições de comercialização da safra.
A irrigação vem sendo apontada há vários anos como uma prioridade para o Estado, devido às constantes estiagens. Já existem diversas linhas de crédito, através de Pronaf, Pronamp, Moderinfra, Finame PSI, que possibilitam investimentos na área. No entanto, segundo a Farsul, o uso dessas tecnologias tem sido restringido por dificuldades burocráticas, especialmente a demora na liberação de eletricidade trifásica pelas empresas distribuidoras de energia e também na concessão de licenças ambientais. “Foram feitas 319 outorgas em 2012, e temos mais de 460 mil propriedades no Rio Grande do Sul. Nesse ritmo, levaria mais de 600 anos para levar irrigação para todas”, lembra Antônio da Luz. “Quem quiser investir nisso, encaminhe projetos para licença ambiental e solicite a energia elétrica para irrigação, e enquanto espera isso acontecer invista em outra coisa, como armazenagem, que é outra necessidade que temos.”
Segundo dados da Conab, o Estado possui 4.826 silos e armazéns cadastrados, com uma capacidade estática de R$ 31,47 milhões de toneladas, sendo 26,37 milhões a granel e 5,10 milhões convencional. Embora o número seja suficiente para abrigar toda a safra gaúcha, grande parte desse volume está no porto do Rio Grande.
Um dos produtores que está investindo em armazenagem é Rodrigo Bergamini. Na Fazenda Bergamini, em Quatro Irmãos, no Norte do Estado, a família planta 1.430 hectares, dos 70% ocupados com soja e os outros 30% com milho. Nesta última safra, as lavouras de milho tiveram uma produtividade de 161 sacos por hectare, enquanto na soja o índice deve ser fechado acima dos 50 sacos por hectare.
Para ter melhores condições de negociação de suas colheitas, os proprietários estão construindo novos silos para duplicar o seu armazenamento de grãos. “Hoje temos capacidade de estocagem de 120 mil sacas na propriedade. Com as novas estruturas, estamos aumentando para 240 mil sacas”, informa Rodrigo Bergamini.
Segundo o agricultor, a armazenagem cria a possibilidade de não ficar pressionado pelo mercado na venda da colheita, uma vez que possibilita o espaço físico necessário para guardar os grãos e esperar por épocas melhores de negociação. “Não temos que correr pra vender porque não há onde estocar a produção, tendo que aceitar os preços menores praticados durante o auge da safra, e não ficamos obrigados a depender de terceiros para guardar a colheita.”
No município vizinho de Paulo Bento, outro produtor que planeja investir em armazenagem é Ilde Bernardon. Em sua propriedade de 405 hectares, dos quais 300 são cultivados com soja, Bernardon não possui silo, o que o obriga a vender a produção logo após colhida. “A gente colhe e envia para esmagadoras da região. Se tiver como armazenar, podemos entregar em outro período do ano e negociar um preço melhor.” Conforme o produtor, o investimento deverá ser iniciado ainda neste ano, dependendo da rentabilidade obtida com as lavouras.
Custos de produção devem reduzir margem de lucratividade
Se os bons níveis dos preços dos grãos – considerados como positivos mesmo com a baixa nos valores pagos devido ao avanço da colheita – apresentam uma tendência de lucro aos plantadores, por outro lado a elevação dos custos de produção para esta safra está retirando parte da rentabilidade da produção. A alta das commodities verificada no ano passado também implicou na inflação de itens importantes para a preparação das lavouras, como fertilizantes e defensivos.
No estudo de custos de produção para a safra 2012/2013 da Fecoagro, em outubro do ano passado, no início do plantio das lavouras, era estimado um aumento médio nos gastos de 17,45% para a soja e de 13,28% para o milho. Somente os adubos tiveram um aumento de 23,26% (soja) e 16,30% (milho). No caso dos defensivos, apenas o glifosato, usado nas lavouras transgênicas, teve um crescimento de 39,3% no valor.
De acordo com o economista Tarcísio Minetto, responsável técnico pela pesquisa, esse encarecimento dos custos, aliado à redução recente nos preços dos grãos, fará com a margem de lucro dos produtores seja menor do que a esperada. “Na soja, numa média de R$ 53,00 a saca, a lucratividade seria em torno de 28%. Quando foi feita a pesquisa, com a saca a mais de R$ 66,00, esperava-se um lucro superior a 70%”, comenta. No milho, a margem será ainda mais reduzida, de acordo com o assessor da Fecoagro: apenas 9,5%, considerando um preço médio para a saca ao redor de R$ 25,00.
No entanto, essas margens de lucro podem ser ainda mais apertadas do o previsto, devido a gastos extras realizados pelos produtores. “Quem teve lavouras afetadas pela ferrugem asiática, por exemplo, acabou tendo que aumentar o uso de defensivos”, lembra Minetto. Outro item que deve reduzir mais fortemente a lucratividade são os preços dos fretes e do uso de máquinas, devido à alta dos combustíveis, lembra Antônio da Luz, economista da Farsul. Somente neste ano, a Petrobras já reajustou o valor do óleo diesel nas refinarias em 10,4% (5,4% em janeiro e 5% em março). “Isso não era esperado no planejamento realizado em antes do plantio. Com certeza os produtores sentirão um impacto forte, mas não podemos ainda mensurar o quanto será.”
Custo detalhado de produção da soja no estado
*Valores apurados em outubro, antes do plantio.
Fontes: Fecoagro AURACEBIO PEREIRA/ARTE/JC
Custo de produção por saca (60 kg)
* Valores médios durante a semana de 15/04 a 19 34,38/04/2013.
Fontes: Fecoagro e Emater AURACEBIO PEREIRA/ARTE/JC
JORNAL DO COMERCIO