Assim começo descrevendo um pouco do que penso do atual mercado pecuário gaúcho, um assunto que gosto e vem tirando o sono de muito produtor, assim como eu.
Sou produtor de ciclo completo e estou passando na pele a queda do preço do boi gordo em uma época que historicamente apresentavam seus melhores momentos para quem vende gado terminado.
O que está acontecendo agora?
Fazendo uma reflexão nas noticias que tem chegado, me atrevi fazer uma análise do atual cenário. Gostaria de começar falando em boi gordo, mas como se trata de uma cadeia de produção, vou começar pelo inicio, ou final, como preferirem.
CARNE – o mercado da carne está muito tímido, segundo analistas e frigoríficos que tenho relacionamento, existe ociosidade de até 50% nos seus abates por razão de falta de boi gordo a preços compatíveis com o que o mercado possa absorver.
Um fator importante e para mim, o maior deles, é retração da economia com redução no poder de compra da população, ocorrendo uma migração do consumo para proteínas mais baratas (frango e suínos), pelo menos a custo prazo.
Por que em curto prazo?
- Pela simples razão do elevado custo de produção (suplementação). Fazendo com que menos produtores entreguem frangos e suínos para abate, gerando num curto/médio prazo uma diminuição de oferta dessas carnes e ocorrerá uma diminuição nessa competição (suínos/aves x Boi).
A exportação, que representa muito pouco no volume abatido de gado no estado, perdeu competitividade de um curto espaço de tempo para cá.
Abandonou o dólar perto de R$4 para ficar na volta do R$3. Alguns otimistas podem me contrariar argumentando a abertura/reabertura de mercados (principalmente China e USA) como solução para sustentar as exportações (volume e preço). Não acredito que isso ocorre logo! China vem demonstrando enfraquecimento na sua economia e assim como os EUA, vem ao Brasil buscar carne barata, reforçando a ideia que a diferença cambial pode atrapalhar esses mercados também. Acredito que a entrada desses mercados, principalmente Estados Unidos, serve como diluidor de risco, não como agregador de valor e volume(no curto prazo ). O que pode acontecer e a mídia já anuncia, é que outros mercados poderão se tornar mais receptivos à carne Brasileira, baseados na abertura do mercado americano.
Dados oficiais mostram que exportações gaúchas, no primeiro semestre de 2016, recuaram 4,4% em relação ao primeiro semestre de 2015. Na decomposição do resultado, observam-se crescimento no volume embarcado para o exterior de 10,2% e retração nos preços médios dos produtos exportados 13,2%. (fonte: http://www.fee.rs.gov.br/indicadores/indice-das-exportacoes/destaque-do-mes/ )
Não podemos esquecer que com qualquer melhora no poder de compra da população, a primeira coisa que se faz é comer um pouco melhor.
BOI GORDO – Quando a Carne sofre, o boi é o primeiro a acompanha-la, que animalzinho bem solidário!
Nas minhas previsões realizadas no ano passado, dentro do nosso negócio, acreditava que o pico de preço no RS seria de julho a agosto, errei feio!
Com relação ao gado confinado, está ocorrendo uma diminuição de oferta, confinadores sólidos estão com a coragem muito reduzida e os especuladores estão com os mangueirões vazios, justificado pelo elevado custo da dieta e restrição ao crédito principalmente. Algumas fontes falam em números entre 7 e 12% de redução.
Neste ponto, acredito que possa acontecer algum movimento de mercado no segundo semestre, pois somando estas informações com noticias recentes de esperança em leve aceleração da economia, com diminuição de competição com as outras proteínas, quem tiver boi gordo no segundo semestre e estiver LIGADO, pode estar pifado, esperando o momento certo de bater, como se diz no linguajar dos “carpeteiros”. Cuidado! Não acredito que isso seja uma regra, acredito em momentos muito pontuais, por isso, vamos ficar atentos.
TERNEIRO – O boi gordo empacou e segurou o terneiro com a ajuda de muitos.
É sabido, em todo estado, que vem ocorrendo uma retenção de fêmeas nas propriedades, seja por produtores que migraram de atividades de recria/engorda ou pelo simples desejo e capacidade de criadores em aumentar seus rebanhos. A atividade da cria, nos últimos anos, esteve atrativa, pelo menos se olharmos um passado recente onde o criador estava na atividade mais pela teimosia do que pelo resultado.
Não tenho muitos dados concretos de produção de terneiros no RS, mas como sou produtor e acompanho esse movimento vou me atrever a comentar a minha linha de raciocínio.
Assim como a carne e o boi gordo, o mercado do terneiro/gado de reposição anda devagar, quase parando.
Acredito que no mercado local existam várias razões para isso, primeiramente vou culpar o clima, o mais fácil de ser culpado! Sim, aqui no RS, principalmente na minha região (sul) ocorreu um excesso de chuvas no final do verão/inicio do outono, quando os produtores de soja estavam se preparando para colher suas lavouras. Ocorreram grandes perdas nas áreas de soja e nas pastagens que vieram, ou viriam na sequencia.
Existem casos de produtores que abandonaram as lavouras de soja e não colheram, consequentemente se descapitalizaram e não conseguiram investir em pastagens e muito menos na compra de animais. Outros colheram um pouco, conseguiram fazer alguma pastagem e estas deram pouco suporte de lotação, o mesmo que ocorreu com quem conseguiu colher e colocou dinheiro no bolso, mas infelizmente o excesso de chuvas foi tão prejudicial que atrasou (quando não comprometeu) os desenvolvimentos das pastagens de inverno. Portanto os invernadores estão comprando muito menos terneiros que nos anos anteriores.
Os outros culpados, no meu raciocínio, são primeiramente a inversão de ciclo de cria, que já vem ocorrendo desde o ano passado. Não tinha sido percebido claramente pela razão de aumento do valor absoluto do kg do terneiro, que simplesmente acompanhou a inflação ou algo muito perto (estabilização). Justifico a caracterização da inversão de ciclo (par baixa), que se confirma agora, pelo aumento de produção de terneiros (consequência da retenção de matrizes nos últimos anos), diminuição de poder de compra do invernador, sejam pelas razões já citadas acima, restrição ao crédito, redução nas exportações de terneiro em pé (em função de cambio ou mudanças nas regras dos países compradores) ou por redução de saída de terneiros para confinamentos no PR e SP.
Alguns podem me perguntar se não está saindo ou não saiu gado em pé do RS para exportação ou confinamentos?
- Claro que saiu! Os programas de carne de qualidade bem estabelecido que tenha clientela fidelizada e agregam valor aos seus produtos seguem e seguirão levando, mesmo que em menor volume. Não podemos esquecer que o mercado está retraído, a dieta está cara e o crédito está escasso. Neste ponto, existe outro fator que acho de extrema importância ao produtor de terneiros e queria alertar. Existem outros estados produzindo o terneiro com elevado grau de sangue de raças europeias e poderão num médio/longo prazo, abastecer os confinamentos que hoje se abastecem exclusivamente no RS. Serão concorrentes em disputa de um mercado com distancia bem menor dos centros confinadores.
De maneira alguma quero ser o “profeta do caos”, até por que não sou especialista no assunto, sou só um admirador e deixo isso para quem sabe, como Alexandre Mendonça de Barros, Lygia Pimentel, Rodrigo Albuquerque, Ricardo Heise e muitos outros que admiro tanto, além disso, sou entusiasmado pelo trabalho e pela pecuária.
Em momentos como esse, não podemos dar como perdido (de perder) e sim como aprendido (de aprender).
Gestão e planejamento bem feitos estão ao nosso alcance, estruture bem e controle seu negócio, não vamos brigar contra o mercado, ele é grande, ligeiro e tem um soco forte.
Nós produtores temos que conhecer melhor nosso cliente, produzir o que ele quer comprar, estabelecer parcerias solidas de longo prazo e com o objetivo que os dois lados ganhem, não procure negócios pontuais.
Não podemos esquecer que nós produzimos commoditie. Tente vender algo mais, sejam conveniências, transparência, informação, facilidade, genética ou sanidade diferenciada. Você escolhe, pode e deve fazer.
Algumas fontes já informam com esperança que pode ocorrer aquecimento econômico para o segundo semestre deste ano, vamos torcer! Mas não se esqueça de fazer o dever de casa.
Um Abraço
Juliano Severo Leon
ESTÂNCIA PEDRA SÓ