quarta-feira, 25 de setembro de 2013

É loucura projetar arroba do boi gordo a R$ 145?

Rural Centro
(*) por Carlos Gattass
Em fevereiro de 2013, neste mesmo espaço, comentávamos sobre as margens apertadas da pecuária de corte no Brasil. No artigo “Investir em gado de corte”, citamos a descapitalização do produtor de carne bovina, que não acreditava no futuro da atividade. Investir o pouco dinheiro que era produzido chegava a ser um tabu no começo do ano. A @ do boi gordo em SP valia R$ 99 e em MS R$ 93. Refletimos naquele artigo: “[...] será que a gente deve ou não deve investir? Eu acho que o produtor rural tem que investir, sim. Momentos de margens apertadas não são eternos e acredito que esses momentos servem para refletir como investir e se preparar para os momentos em que a pecuária nos dá fôlego”.
Todas as tendências apontavam que o momento da virada estava próximo. Quatro meses depois de publicar o conteúdo citado acima, fizemos um balanço de mercado. No início de junho, dizíamos no artigo “Pecuária no Brasil 2013: fase de alta do ciclo está próxima” que o pior já havia passado. “Três pontos merecem destaque: em primeiro lugar, o abate anual, que em 2012, segundo o IBGE, foi o maior da história, saltando 8% em relação ao ano anterior, ficando acima do de 2007, ano em que estávamos em processo de recuperação de preços pós-aftosa. O segundo é em relação às exportações de carne bovina in natura, que em 2013, considerando o período de janeiro a maio, anotaram o terceiro maior resultado para o período, muito próximo dos patamares de 2007 e 2008. O terceiro é em relação ao bezerro desmamado (nelore de 180 quilos), que atualmente vale R$ 743/cabeça (média de março a maio de 2013 em Mato Grosso do Sul), estando mais valorizado e mais demandado que em 2012, quando valia R$ 662/cabeça, cenário também muito parecido ao de 2007”, lembrávamos. A @ do boi gordo em SP já valia R$ 101 e em MS R$ 94.
Pouco depois, em 19 de junho, o setor percebia a situação de mercado pela qual a pecuária passava. Em entrevista concedida à Rural Centro, o consultor Maurício Palma Nogueira afirmou que a atividade continuava em uma curva ascendente em relação ao uso de tecnologia, o que, segundo a nossa análise, demonstrava que os pecuaristas profissionais buscavam o aumento de produtividade mesmo antes da virada do ciclo.
Essa rápida reação nos preços, mesmo com o abate em alta, pode ser justificada, entre outros motivos, pelo crescimento da exportação e pela própria seca (geada), como aconteceu no Mato Grosso do Sul, que é um grande mercado e exporta bastante. Isso, querendo ou não, ajuda a enxugar o excedente interno de gado gordo. A alta do dólar também ajudou muito, mas não foi fator principal, até porque no início do ano o dólar ainda não tinha subido. A fase do ciclo pecuário, ou melhor, a soberania do mercado, colocou a pecuária de corte no fundo do poço em 2012 e também a resgatou de lá em 2013.
Abates
AnoAnimais abatidos (milhões de cabeças)
201121,8
201223,5
2013 (até agosto) *17,6
Os abates no ano de 2013, que até agosto somam 17,6 milhões de cabeças, apresenta um crescimento de 9,9% em relação ao mesmo período de 2012, quando os abates até o mês oito somavam 15,5 milhões de cabeças. Fonte: Mapa.
Exportação
Exportações de carne bovina 2013

Exportações de carne bovina: em 2011, ano de crise na pecuária, as exportações caíram 11% em relação a 2010. Já comparando 2012 com 2011, há crescimento de 13%. Em 2013, até junho, o crescimento observado é de 21%, como mostra o gráfico acima. Fonte: SECEX-MDIC. Elaboração: Abiec.
Boi x Soja x Cana x Eucalipto x Inflação x Custo de produção
Essa virada tinha que acontecer, caso contrário não haveria mais pecuária. A remuneração de quem produzia carne estava tão ruim quando comparada com outras atividades agrícolas que o produtor rural entregava suas terras para qualquer atividade que não fosse pecuária. Perdeu-se área de pastagem para cana, soja/milho e eucalipto. Além disso, a inflação e o custo de produção comeram o pouquinho do reajuste que tivemos entre 2006 e 2010. Não estou dizendo que esse boi de R$ 103 hoje no MS, que é o boi de R$ 108 em São Paulo, é excelente. Não é! Ele não está nem perto de bom.
Em SP, no pico da alta de 2010 a @ era cotada em torno de R$ 115. Aplicando uma inflação de 5% ao ano durante 2011, 2012 e 2013, essa mesma @ de boi teria que valer R$ 130 a R$ 135 para remunerar tão bem quanto em 2010, isso sem considerar o aumento do custo de produção. Então esse boi de R$ 108 em SP ainda está muito defasado em relação ao boi de 2010, que era bom na ocasião. Esse boi de 2010 bastou para aliviar a atividade naquele ano e nada mais que isso.
Áreas de pastagens e áreas de lavoura no Brasil: história ente 1975 e 2011.
De 1975 até 2011, pecuária perdeu 15 milhões de hectares, enquanto a lavoura ganhou 23 milhões. Fonte e elaboração:Produtividade e Crescimento – Algumas Comparações / Mapa
Novo ciclo da pecuária: a virada
O importante da história toda é que a gente está no início do ciclo de alta e provavelmente teremos até 2015 anos bons. O alvo para 2013, no meu entendimento, é o topo de 2010, ou seja, um boi que se iguale ao registrado em SP naquele ano: R$ 114 a R$ 117. No mercado físico, nós estamos com um boi de R$ 108 em SP. No mercado futuro para outubro, R$ 109. Será que ainda vai subir uns 5 a 7 reais?
No MS, a diferença de base está bem mais estreita, e isso nos faz acreditar que o boi de R$ 105 no MS será superado, provavelmente em virtude do avanço do eucalipto, cana-de-açúcar, soja e milho sobre as pastagens. Estamos hoje mais próximos de SP do que estávamos em 2008 ou 2010. O rebanho do MS não acompanhou o crescimento da demanda.
Honestamente, não achávamos que fosse melhorar tanto já esse ano, mas sim em 2014 ou 2015. Esperávamos esse ano um boi melhor, próximo dos R$ 100 no MS. Para quem teve um boi de R$ 96 como o melhor preço de 2012 no MS, R$ 103/@ em 2013 já está excelente.
Eficiência produtiva
Voltamos a falar aquilo que comentamos em fev/13. Conheço pecuarista que vive da atividade, assim como já viviam seu avô e seu pai. São pessoas que não têm grandes extensões de terras, que produzem em 1000 a 1500 hectares e que sustentam duas ou três famílias. Isso a partir da alta eficiência. Esse produtor passa apertado nos momentos ruins, mas sobrevive. Não descapitaliza a fazenda, nem quando tem um boi de R$ 92. Já com esse boi de R$ 103 faz sobrar dinheiro ao ponto de retornar fertilidade para o solo, aumentar a quantidade de rebanho, tecnificar mais ainda a propriedade e, nas melhores situações, até comprar novas áreas.
O pecuarista que prepara sua fazenda para surfar quando a onda vem está bem e vai continuar bem. Essas correções que ocorrem de tempos em tempos com as atividades agrícolas arrumam o mercado. Se você permanece na atividade e prepara o seu negócio, quando ele sobe, sobe junto o boi gordo, o bezerro, boi magro, novilha... todo o patrimônio em gado cresce! Mesmo que a atividade fique ruim de dois a três anos seguidos, como foi em 2011 e 2012, quando não havia boa remuneração em relação ao custo de produção, o novo ciclo corrige. Vai corrigir em 2014 e 2015.
No longo prazo, a curva de preço é ascendente, mas tem que ter eficiência. Se não tiver eficiência o risco aumenta porque o produtor fica à deriva no mercado. Por isso é que tem que permanecer na atividade. Não dá para se desfazer da atividade porque um ou dois anos foram ruins. A gente já viu esse filme em 2005 e 2006. Vimos de novo em 2011 e 2012.
Hoje dá pra falar que o ciclo virou porque a gente tem o menor preço de 2013 acima do observado em 2012 e o maior preço de 2013 também acima do visto em 2012. Quando comparávamos 2012 a 2011, o menor preço de 2012 foi menor do que em 2011 e o maior preço de 2012 também foi menor que em 2011. Estavamos em ziguezague descendente. Agora, passou para ascendente. A projeção é seguir assim, em alta. O que é difícil é prever neste começo do novo ciclo com qual intensidade a recuperação virá, mas permanecerá até 2015 - assim acreditamos! Fazendo uma conta bem simples e corrigindo 2010 com 5% de inflação até 2015, a gente teria que ter um boi de R$ 145 em São Paulo. É loucura falar isso hoje? Aparentemente sim, mas não é impossível.
Bezerro nelore 180 kg - CG
 20122013
Preço mínimoR$ 633,42R$ 696,24
Preço máximoR$ 703,44R$ 812,16
Boi gordo Campo Grande 30 dias
 20122013
Preço mínimoR$ 88R$ 92,50
Preço máximoR$ 97R$ 105

Carlos Gattass

(*) Carlos Gattass é médico veterinário e mestre em ciência animal com ênfase em nutrição de ruminantes pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e sócio-diretor da Rural Centro.




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