Prof. Júlio Barcellos *
A segurança alimentar é o principal desafio do futuro, pois terra e água são cada vez mais escassos para a produção de alimentos. Essas preocupações parecem irrelevantes, afinal estamos entre os principais exportadores de alimentos. Entretanto, já vivemos períodos de escassez onde filas eram formadas para comprar leite, pão e carne bovina. O alimento típico do gaúcho, a carne de gado, objeto deste texto, há 50 anos, produzia manchetes como “Carne só volta aos açougues em 1965”. Às vésperas de 2015, talvez o leitor não entenda a lógica deste artigo.
Vale explicar que nos últimos meses o tema da escassez de carne reapareceu. Perguntam-nos se temos gado e produzimos carne suficiente para abastecer os gaúchos, especialmente porque aumentou o preço do churrasco. Criar barreiras para não “deixar” nosso gado ser “exportado” para outras regiões, tem surgido como solução. Talvez, agora o leitor entenda: estamos discutindo a segurança alimentar regional – o churrasco. O que está acontecendo é apenas o desequilíbrio conjuntural entre a oferta e a procura e os seus reflexos no preço da carne. Nossa produção é a pasto e nos meses de junho e julho, por causa do inverno, os abates sofrem redução, provocando um aumento do preço do boi e no preço pago pelo consumidor. À medida que o clima vai melhorando a oferta também se ajusta. Além disso, o RS possui um rebanho para carne estimado em 12 milhões de cabeças, e 93% da produção é consumida aqui. Ainda sobram 7% que é vendida a Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Portanto, a circunstancial falta de carne não está relacionada ao tamanho do rebanho bovino ou com a baixa produtividade da pecuária e, menos ainda, com as exportações de gado em pé.
A produtividade da pecuária vem aumentando e o número de animais para o abate cresce no Estado, portanto, de forma alguma preocupa o abastecimento e a soberania do suprimento de carne. De outra parte, existem práticas do varejo que podem, a qualquer momento, oferecer cortes de carne bovina oriunda das regiões norte, centro-oeste do Brasil e até mesmo do Uruguai. Isto é uma decisão estratégica do setor e não está relacionada com a escassez da carne gaúcha. Atualmente, os pecuaristas têm o seu gado disputado por vários frigoríficos e o merecido reconhecimento pelos esforços feitos na qualificação da produção. Isso tem assegurado ao consumidor uma carne saudável e saborosa em qualquer ponto de venda. Agora, a fila é outra, em busca da excelência, diferente daquela do passado, da escassez. Assim, as ameaças à soberania do churrasco gaúcho não passam de informações desatualizadas e assimétricas na cadeia produtiva da carne bovina.
*Coord. do Núcleo de Estudos em Sistemas de Produção de Bovinos de Corte e Cadeia Produtiva (Nespro/ UFRGS) JOSÉ FERNANDO PIVA LOBATO* Professor do Dep. de Zootecnia da Faculdade de Agronomia da UFRGS
Artigo publicado no Caderno Campo & Lavoura
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