sábado, 14 de julho de 2012

Mercado de boi pra quem não tem boi...nem vaca


Rogério Goulart, administrador de empresas, pecuarista e editor da Carta Pecuáriacartapecuaria@gmail.com
Reprodução permitida desde que citada a fonte
 
Essa semana gostaria da falar de algo diferente, mas antes vamos dar uma olhada nos preços da arroba em São Paulo.



Repare: os preços não se afastaram muito do intervalo entre 92 e 93 reais desde maio. O que é interessante nisso daí é saber que as escalas de abate estavam lá em maio ao redor de sete dias e hoje estão ao redor de quatro.

Com preços estáveis e ao mesmo tempo escalas diminuindo, isso pode nos dar duas pistas do estado atual do mercado pecuário — a oferta está diminuindo ou o frigorífico está deliberadamente reduzindo seus abates em função do estreitamento das margens.

O fato que permanece é a foto — sob o ponto de vista dos preços, a safra de 2012 tem o formato de uma mesa de jantar — resta saber quem é que está sentado na mesa comendo e quem está trabalhando, em pé, servindo.

Mas o que queria falar hoje é outra coisa, uma coisa diferente. No final do texto da semana passada comentei de passagem sobre operações em bolsa no final do texto, sem necessariamente aprofundar no assunto. Queria retomar essa coisa de bolsa sob um foco diferente.

De um modo bem simplista, caro leitor, podemos classificar quem negocia boi na bolsa em duas categorias. Quem mexe com boi e quem não mexe. O sujeito que mexe com boi pode ser tanto um pecuarista, qualquer um, nem precisa ter boi, pode ter vaca também. Quem mexe com boi obviamente também é o frigorífico e, um pouco mais distante, uma empresa de alimentação, tal qual um restaurante que serve um bife, ou até mesmo quem só mexe com a carne crua, como um supermercado.

Esse curral lotado de gente lida com as flutuações para cima/baixo do preço do boi e da arroba, pois podem influenciar para bem ou para mal seus negócios.

O outro lado é o cara que não mexe com boi. Não tem fazenda. Não tem gado. É o cara urbano, da cidade, com viés somente de olhar para a flutuação de preço da arroba e pensar de forma especulativa: “Como é que eu posso ganhar dinheiro com isso se a arroba subir (ou cair)?”

No livro “Mercadores da Noite”, Ivan Sant’Anna chamou esse cara urbano e fora do setor de “dentista”. Nassim Taleb também.

É claro que isso é um exagero literário — um cara que não mexe no setor não precisa ser um dentista. Pode ser um fundo de investimento, um banco operando para sua tesouraria, um fundo de pensão, um investidor estrangeiro... pode ser qualquer um que não possua o boi como meio de trabalho.

Hoje o foco é para essa turma que não mexe com boi. Bom, imediatamente, isso gera um problema. Se o cara não mexe com o boi, como ele faz para neutralizar as oscilações em bolsa? Quero dizer, a gente sabe que quem mexe com o bovino tem no próprio animal, ou no próprio valor do animal, para ser mais exato, como o seu grande avalista do negócio.

Se o boi sobe na bolsa, sobe no pasto e vice versa. O cara que não tem boi, não. Se o boi sobe na bolsa e ele está vendido, ele vai perder dinheiro. Simples assim. Tomou prejuízo e não“ajuste negativo”. Ajuste negativo é para quem usa o boi. Quem não tem lastro físico, o risco da bolsa, o prejuízo e o lucro é sentido diretamente no bolso.

A não ser que o sujeito tenha uma poupança para investir.

A poupança, o dinheiro para deixar de reserva para (não confundir com margem de garantia) investir é o assunto de hoje. Claro, bom para você, trabalhou bastante nesses últimos anos e sobrou uns trocados. A bolsa de futuros oferece um prato cheio de mercados para serem utilizados para ganhar dinheiro e aumentar ainda mais seu rico
dinheirinho.

Também pudera! Por um pequeno montante de dinheiro, vai, dois mil reais, você consegue movimentar um mundo velho de contratos de boi gordo, certo?

Mas será que essa conta está certa? Quero dizer, se você coloca dois mil reais e esse é seu único dinheiro, se pegar um mercado que vai contra você, dois mil reais em cinco contratos, por exemplo, desaparecem literalmente em um dia e você corre o risco de ficar devendo ainda.

Ou seja, existe um risco enorme e ignorado em contratos futuros.

Esse é um cenário bem comum — o sujeito quer utilizar os mercados futuros para alavancar seu dinheiro. Seduzido pelas possibilidades de ganhar muito utilizando pouco, essa pessoa está se expondo a um risco muito maior do que deveria.

Isso não ocorre só em boi, é claro. O cidadão que é da cidade e quer especular nem vai necessariamente parar aí. Vai também para o milho, soja, dólar, índice, DI...

Como medir isso? Como, mediante a um valor que estou disposto a deixar reservado para negociar mercados futuros, saber qual o tamanho de posição que posso tomar? O que quero dizer é o seguinte. De que forma posso negociar prudentemente na bolsa e ao mesmo tempo ter a possibilidade de perder um pouco de dinheiro sem correr o risco de perder TODO o meu dinheiro? Como posso controlar minhas perdas até que apareça a grande sorte de ganhar um montão de dinheiro?

Não se deixe iludir pelo jeito simples que eu falo essas coisas, caro leitor. Tamanho da posição negociada em mercados alavancados como os mercados futuros é de crucial importância em função da extrema violência em que os preços sobem e descem, às vezes, sem estarmos devidamente com o dinheiro na conta para bancar a brincadeira.

Uma forma bem simples é a regra do 1%. Risco 1%. O que quer dizer? Não perca mais que 1% em cada operação que você faz, e nunca arrisque mais que 5% do seu patrimônio ao mesmo tempo.

Ou seja, se você reservou R$ 100.000,00 para negociar mercados futuros e quer negociar boi gordo, você pode negociar pequeno usando 1% de risco ou pode negociar grande colocando 5%. Ou dividir 1% em cinco mercados diferentes.

Isso daí, então, fazendo as contas em cem mil reais daria um valor entre R$ 1.000,00 e R$ 5.000,00 que você está disponibilizando para PERDER naquela tal operação. Fazendo as contas de forma bem simples, uma posição de R$ 1 mil deixa você negociar 3 contratos na bolsa. Uma posição de 5 mil reais deixaria você negociar 15.

“Hein? Rogério, não entendi.” Perai, não tem jeito, vou ter que usar uma tabela.



Repare que os mesmos 1% dos 100.000 reais é o que você utiliza como referência para o contrato futuro. Referência de quê? Ora referência para você cair fora do contrato quando os preços oscilam contra você.

Se está comprado em três lotes na bolsa no valor que o mercado fechou nessa sexta feira R$ 96,85, se os preços caírem 0,96 centavos, 96,85 - 0,96 = 95,89; caia fora.

Se estiver vendido no valor do fechamento, R$ 96,85 e o mercado subir 0,96 centavos, 96,85 + 0,96 = 97,81, caia fora. Fazendo isso você limita seu prejuízo, com 3 contratos, em mil reais. Te sobra ainda 99 mil para tentar a sorte outra hora.

O que a gente vê não é isso. A gente vê o cara com 100 mil reais operando 30 lotes... 50 lotes até. Tem vez que o cidadão male mal tem 10 contos no bolso e já quer operar 10 lotes... Isso é insano e irresponsável.

Essa é uma regra simples, caro leitor, para ser seguida como plano inicial de risco. Claro, quem é pecuarista também pode fazer algo parecido com isso, mas não é o foco aqui. A ideia é ajudar para quem vai usar a bolsa como uma “aplicação” de risco a usar o risco de forma prudente e produtiva.

Sugiro dar uma pensada em controlar seus riscos. Vou te falar, é uma paz saber que o mercado vai te tirar da operação quando você está errado. O melhor é saber que ele vai te tirar com um prejuízo pequeno, ao invés de ir teimando e teimando e acabar com um abacaxizão nas mãos na forma de uma paulada forte na cabeça.

Ou seja, tomar 1.000 reais de prejuízo é sem dúvida melhor que uma paulada de 30.000 reais. Trinta mil, por incrível que pareça, é mais comum de acontecer que 1.000, caro leitor, exatamente pela pessoa não conhecer, ou não saber como funciona um controle sério de risco e de tamanho de posição em operações de bolsa.

E falando em operações de bolsa, o mercado te tira, na prática, pelas ordens limitadoras de prejuízo, conhecidas como ordens stop.

Depois, quando você tomar gosto por controlar seu risco na bolsa, perceberá que o risco em si também se altera. Tem épocas que o mercado é mais arriscado que outras épocas.

Observe o gráfico a seguir e veja como uma posição de R$ 100 mil poderia, para um risco de 1%, quando calculada sobre a oscilação dos preços, ter gerado negócios com três até seis contratos.



Enfim, está aí uma contribuição para você melhorar suas negociações de boi gordo na bolsa, mesmo para quem não tem boi gordo.


MOVIMENTAÇÃO DO MERCADO: Boi -- Indicador ESALQ/BVMF do boi, que mede a variação dos preços da arroba no Estado de São Paulo, fechou a semana com +0,19 a R$ 92,88 à vista. Cotações em R$ por arroba.

A média móvel de 5 dias fechou em R$ 92,72. O contrato de julho/12 fechou com –1,98 a R$ 92,12. O contrato de julho está 0,60 centavos abaixo do preço médio de liquidação do contrato.

O contrato que vence em agosto/12 fechou com –2,33 a R$ 93,26; setembro/12 –1,85 a R$ 95,15; outubro/12 –1,77 a R$ 96,85.

Todos os vencimentos estão cotados à vista com o fechamento da sexta-feira e com a indicação semanal da variação
de preços.

Bezerro -- Indicador ESALQ/BVMF de bezerro, que mede a variação dos preços no Estado do Mato Grosso do Sul, fechou a semana com –10,20 cotado a R$ 704,14 à vista. Cotações em R$ por bezerro.

A arroba do bezerro cotada ao redor de R$ 105,00, queda de R$ 7,00 na semana.
Todos os vencimentos estão cotados com o fechamento da sexta-feira e com a indicação da variação semanal.

Taxa de Reposição 1 -- Um boi gordo compra hoje 2,18 bezerros, alta de 0,04 na semana.

Dólar -- Dólar comercial fechou com +1,04% a R$ 2,031. Dólar futuro com vencimento no início de agosto fechou
com +0,97% a R$ 2,043; setembro fechou com +1,00% a R$ 2,056.

Juros -- A taxa de juros do governo (SELIC) está hoje em 8,50% ao ano.

Inflação – IGP-M de junho +0,66%. Acumulado no ano2 +3,15%. Acumulado nos últimos 12 meses3 (julho-11 a junho-12) +5,03%.

Assim como os contratos de boi e bezerro se encerram pelo preço dos seus respectivos indicadores, o dólar se encerra pelo preço do dólar do Banco Central nas datas acima indicadas.

Frigoríficos 4 -- A arroba nos frigoríficos foi cotada hoje em São Paulo ao redor de R$ 93,00; no Mato Grosso do Sul, Dourados a R$ 86,00 (Base –7,5%) e em Campo Grande ao redor de R$ 87,00 (Base –6,5%).

A arroba em Goiânia foi cotada ao redor de R$ 83,00 (Base –10,8%).
Em Cuiabá está em R$ 83,00 (Base –10,8%).

No sul do Tocantins a arroba foi cotada em R$ 84,00 (Base –9,7%). No Triângulo Mineiro ao redor de R$ 86,00 (Base –7,5%).

1 Considerando os valores nominais dos indicadores da ESALQ/BVMF.
2 e 3 Somatória com Juros Simples.
4 Fonte completa dos preços da arroba nos frigoríficos à vista e livre do Funrural: Informativo Boi na Linha, da Scot Consultoria.


CONCLUSÃO: Essa é a segunda semana seguida em que a arroba do boi em São Paulo, medida pelo indicador Esalq/BVMF, fecha em alta. Ok, como disse no início do texto, é uma alta pequena... O mercado está assim, pequeno, subindo um pouquinho aqui, caindo um pouquinho ali, desde maio.

Difícil viver em um mercado parado, de lado, como atualmente. Queria saber o futuro como você. Queria saber quanto vai estar a arroba mês que vem também... Só sei que, aqui, ao redor de 93 reais, a arroba está barata. Mas vai saber para o futuro? O duro é que minha bola de cristal quebrou.

Até mais,

Rogério Goulart

Nota da Bigma Consultoria: O texto de Rogério Goulart, da www.cartapecuaria.com.br , publicado nesse espaço, foi resumido e alguns gráficos podem ter sido suprimidos. Acesse a análise completa e com os gráficos no site da Carta Pecuária 
 

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