Foto: arquivo ABCZ
Por: Silvia M. de Queiroz Caleman (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul)
Ainda em 2009, a publicação do documento do Greenpeace intitulado “A Farra do boi na Amazônia[1]” acusando essa atividade econômica de ser a responsável pela maior parte do desmatamento da Amazônia Brasileira gerou um conjunto de demandas e iniciativas, entre as quais se destacam a exigência de garantias sobre a origem da carne bovina por parte do varejo (nacional e internacional) em que assegure que não seja proveniente de áreas de desmatamento. Soma se a iniciativa dos diferentes agentes do Sistema Agroindustrial (SAG) da Carne Bovina – produtores, indústria frigorífica, varejo e as organizações de apoio (instituições de pesquisa e bancos) – de se organizar em fóruns e grupos de trabalho para discutir os desafios, soluções e protocolos de produção, processamento e consumo sustentável[2]. Com isso, cria-se um ambiente profícuo para as reflexões sobre uma pecuária sustentável.
O tema “sustentabilidade” está hoje presente nos mais diferentes fóruns. Cientistas, empresários, jornalistas, estudantes, governo, enfim, toda a sociedade discute os desafios impostos por essa nova ordem mundial. Existem inúmeros estudos acadêmicos que discutem as soluções para uma produção sustentável de carne a partir de tópicos pontuais como a medição da emissão de gases de efeito estufa, principalmente, gás metano e CO2 impacto das mudanças climáticas na produção pecuária manutenção e conservação de áreas de Reserva Legal – RL - e Áreas de Preservação Permanente - APP, pegadas de carbono, o consumo de água na pecuária, pecuária sustentável, efeitos da nutrição do gado, maior produtividade do rebanho, pastagem ecológica e serviços ambientais, entre outros. Não se pode negar a relevância desses temas para a sustentabilidade da pecuária bovina, porém, tratar essas questões de modo pontual e independente não garante a profundidade de análise que a complexidade do tema merece.
Pensar a pecuária sustentável nos leva, necessariamente, à aplicação de uma abordagem sistêmica. Refletir como os diferentes agentes econômicos se organizam para produzir e entregar ao consumidor final um produto (carne) ambientalmente correto, socialmente justo e viável economicamente é fator determinante para a promoção da sustentabilidade na pecuária. Com isso, compreender como novas práticas de produção sustentável são adotadas, incorporadas e contratadas ao longo da cadeia produtiva é uma questão chave para se viabilizar a sustentabilidade na pecuária bovina.
No entanto, as dificuldades de coordenação do setor são conhecidas. A SAG da carne bovina é caracterizada por baixa integração contratual e vertical, prevalecendo neste sistema as relações de mercado spot. Dado o novo contexto do SAG da carne bovina - preocupação com a saúde, com o bem estar animal, com a conservação ambiental e a exigência de rastreabilidade do produto por parte de consumidores internacionais – a demanda por uma coordenação mais efetiva entre os elos da cadeia torna-se um fator crítico para o sucesso desse sistema produtivo.
Todas essas demandas e iniciativas geram mudanças na organização da cadeia da carne bovina. A necessidade de maior compreensão dos aspectos de coordenação dos agentes econômicos que participam d Sistema Agroindustrial (SAG) da pecuária bovina sustentável é o ponto de partida para a promoção e o desenvolvimento da sustentabilidade no setor. Sob essa abordagem, a coordenação entre os elos de uma cadeia produtiva assume papel de relevância, sendo o modo de coordenação resultado do padrão da transação e do ambiente institucional (leis e regramentos) que regem as relações dos agentes econômicos.
Ficam aqui alguns questionamentos finais que nos parecem estratégicos para uma reflexão sobre os desafios e encaminhamentos em prol da pecuária sustentável: i) Qual o padrão das relações entre os agentes econômicos ao longo do SAG da pecuária sustentável?; ii) Qual o papel das instituições (formais e informais)?; iii) Quais estruturas de governança (arranjos organizacionais) estão presentes?; iv) Quais os incentivos oferecidos para a produção bovina sustentável? v) Qual o papel das certificações e dos selos para uma coordenação eficiente[3] desse SAG? Que essas provocações instiguem profissionais e pesquisadores da pecuária brasileira a adotar um olhar sistêmico para o desenvolvimento da pecuária sustentável.
[1] Para maiores detalhamento sobre esse os resultados apresentados por esse relatório videhttp://www.greenpeace.org/brasil/Global/brasil/report/2009/6/FARRAweb-alterada.pdf
[2] Entre as iniciativas em prol de uma pecuária sustentável se destacam a formação do Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável (www.pecuariasustentavel.org.br), Programa de Pecuária Sustentável da DOW Agroscience Brasil e a Associação dos Profissionais da Pecuária Sustentável (APPS).
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