Luciano Medici Antunes (PLANEJAR), foi palestrante no Workshop BeefPoint – Certificação e Rastreabilidade, realizado em São Paulo nos dias 07 e 08 de ago/12. Luciano trabalha com desenvolvimento de soluções para o agronegócio brasileiro, e a rastreabilidade faz parte de suas atividades. No evento, Luciano apresentou sua leitura e visão sobre o SISBOV.
Logo no início, ele comenta que a desinformação sobre o protocolo de rastreabilidade nacional no Brasil “é muito grande atualmente”. De maneira geral, na opinião de Luciano, é que a impressão que se tem do SISBOV é relacionada somente às seguranças alimentar e mercadológica. Além disso, Luciano enfatiza que a rastreabilidade é uma ferramenta de gestão.
Atualmente, a adesão de pecuaristas ao SISBOV está praticamente paralisada, e Luciano cita algumas possíveis causas para este baixo aproveitamento. Uma delas, e provavelmente a maior, foi a “politização” sobre a formulação e implantação do protocolo no país. Existem ainda diversas discussões, avaliando como melhorar o sistema. Luciano comenta que há vertentes argumentando pela extinção do SISBOV, por sua simplificação, e também se deve ser gratuito ou não.
“Os discursos são variáveis”, diz Luciano, e as diferenças entre as reais exigências e o discurso sobre o SISBOV são que confundem os usuários. Pela norma brasileira, não há diferenças comparando-a com a norma exigida pela Europa, as regras são equivalentes. Porém, o grau de exigência requisitado no Brasil está em desacordo com as exigências praticadas na Europa. Aqui no país, a margem de erro permitida é praticamente zero, “e na Europa não é assim”. Luciano complementa que “é necessário atender o mercado, somente com imposições, a rastreabilidade não vai funcionar”.
Outro ponto crítico no Brasil é o desconhecimento técnico de setores envolvidos no SISBOV. “Há seis anos o SISBOV é o mesmo”, disse Luciano, “alterado somente por uma Instrução Normativa”. Ainda, ele diz que a discussão entre a indústria, produtores e certificadoras “está focada somente no curto-prazo, na questão de quem irá pagar o prêmio, se haverá prêmio, e um setor fica culpando o outro”. Luciano alerta que a rastreabilidade é uma ferramenta de gestão, e até cita a palestra de André Bartocci, realizada no mesmo Workshop, quando ele mesmo mostrou seu gerenciamento baseado na rastreabilidade, “e não citou a palavra frigorífico. André mostrou seu trabalho, seus ganhos, e não reclamou nenhuma vez da indústria. Seu planejamento é de longo-prazo”. Luciano comenta também sobre o baixo aproveitamento das exportações nacionais pela Cota Hilton. O valor é atraente e a Europa demanda esta carne. “O potencial existe e não evoluímos praticamente só por causa de questões políticas”.
Outro fator de complicação atual, é a PGA (Plataforma de Gestão Empresarial). Luciano explica que a PGA não está relacioanda com SISBOV, “e se ouve muito falar das duas coisas como sendo uma só”. A PGA foi criada para servir de base para armazenamento de cadastros e dados, centralizando-os. Primeiramente, seria utilizada para registrar informações de propriedades e produtores, unificando estas informações em um só banco de dados. Como segunda função, a PGA abrigaria os dados da GTA eletrônica e por último, futuramente os protocolos de certificação seriam registrados dentro da PGA, tornando-os acessíveis, inclusive o do SISBOV.
Como previsão para iniciar sua utilização, Luciano explica que o sistema está ainda em implementação, e cada estado do país está desenvolvendo sua maneira para implantá-lo. Ele deixa algumas questões, indagando como seria o processo de implantação da PGA em todo o país, referindo-se às complicações para se conseguir uma comunicação nacional entre os dados. Por exemplo, ele questiona quem iria gerenciar a plataforma, quem seria o responsável pelos serviços, qual o custo para o produtor e quem controlaria os dados e informações inclusas.
Após suas reflexões, Luciano questiona: vale a pena fazer o SISBOV? Em sua opinião vale a pena sim, pois “nunca se perde dinheiro com o SISBOV”, explicando que o valor recebido a mais pela arroba compensa as despesas que o produtor tem como investimento. Ele chama a atenção para além do ganho financeiro, “há os ganhos vindos com a nova gestão da fazenda”. Porém, Luciano explica que a adesão é praticamente nula devido às promessas dos governos estaduais e federal, que comunicam diversas formas de apoio ao SISBOV, simultaneamente com o lançamento da PGA, sem concluir o que é prometido. Desta forma, os produtores ficam a espera do que será resolvido e não iniciam seu processo de rastreabilidade.
Comparando as possibilidades do produtor, em esperar o funcionamento da PGA ou começar a rastrear pelo SISBOV, Luciano diz que é possível implantar a rastreabilidade e “colher os primeiros frutos” a partir de 120 dias. Segundo Luciano, a indústria precisa de animais aptos à Lista Traces, e não está tendo oferta suficiente pelos pecuaristas.
Além da desinformação a respeito do SISBOV, de sua politização e da divulgação e não lançamento da PGA, Luciano aponta mais um fator complicador: a Lei da Rastreabilidade (12.097). “Esta lei também não é o SISBOV”, ela apenas regulamenta que a rastreabilidade é voluntária, e entrega seu controle à CNA, retirando a função das atuais certificadoras. Porém, Luciano deixa claro que esta lei existe e não é cobrada. Ele explica que somente existe a possibilidade da CNA controlar a rastreabilidade nacional futuramente.
Luciano comenta que mesmo sendo contrário à sua atuação comercial, ele acredita que a rastreabilidade obrigatória é inviável no Brasil, “pelo menos num curto espaço de tempo”. Ele relembra casos em que pessoas querem aprender sobre rastreabilidade bovina com o Uruguai, entretanto, “o Uruguai é menor que o Rio Grande do Sul, e o item número um em sua balança comercial de exportação é a carne bovina, muito diferente do Brasil. Aqui no país, a nível de governo, estas exportações praticamente não têm importância”, acredita Luciano.
Ele finaliza resumindo sua palestra, dizendo que o SISBOV é um fato, está ativo e sem alterações há seis anos (exceto pela Instrução Normativa). Assim, a rastreabilidade é possível, e quem tem o SISBOV hoje está aproveitando a oportunidade, até porque a indústria exportadora demanda esses animais e há necessidade de um maior volume de exportações à Europa. Portanto, a mesma indústria não se compromete no desenvolvimento do sistema nacional, inclusive porque existem riscos, e os pecuaristas que não estão no SISBOV “ficam de fora devido à enorme quantidade de informações confusas, e aguardam para ver no que vai dar”, conclui Luciano.
Após sua palestra, Miguel Cavalcanti (BeefPoint) pede para Luciano definir novamente o que é a PGA e a Lei da Rastreabilidade.
Luciano explica que a PGA teria três funções:
1) Ser base de um cadastro unificado de proprietários e propriedades, “pois hoje o registro destas informações é diversificado;
2) Integrar estes dados nacionais entre os estados para utilizá-los na formulação da GTA eletrônica, “o que não é possível hoje, a estrutura necessária não existe ainda”; e
3) Ser o depósito oficial de protocolos voluntários: de certificação, de bem-estar, e de sustentabilidade por exemplo.
Já sobre a Lei da Rastreabilidade, Luciano disse que ainda “não conheceu nenhum produtor afetado pela lei”, ele não enxerga o motivo de sua criação e não existem mudanças de processos e fiscalização sobre sua implantação.
José Ricardo Rezende (pecuarista e desenvolvedor de softwares) complementa a conversa, dizendo que “o cadastro nacional das fazendas é essencial. No Paraguai e Uruguai existe o cadastro único. No Brasil não existe, nem o endereço é cadastrado. A PGA seria uma solução”. Luiz Henrique Witzler (IBD, SBC) também é favorável à PGA, comentando que ”como base, é necessário antes de tudo o cadastramento único de produtores”.
Miguel volta a questionar, e pergunta ao Luciano quais são as maiores inconformidades encontradas nas fazendas potenciais para aderir ao SISBOV e como ele resolve essas situações.
Luciano diz que “a exigência da UE é factível, mas a auditoria da governo federal é variável e excessiva. Depende do humor do auditor” comenta Luciano, e chega a “beirar o ridículo. Não tem critério de penalidade: há certificadoras aptas que são penalizadas e descredenciadas sem fundamento”, comenta o especialista. Ele reforça que “a regra da UE não é exagerada, porém a auditoria nacional que é complicada. Existe um exagero”, e deixa uma questão: “por que o SISBOV não é fiscalizado ou auditado pelo INMETRO? Já estaria pronto, seguindo padrões de qualidade ISO”.
Informação completa: O tema é relevante para o evento e o palestrante é uma das pessoas que mais vivenciou o Sisbov ao longo desses anos. Mas é importante informar que a Planejar foi patrocinadora gold do workshop.
Artigo escrito por Marcelo Whately, analista de mercado da Equipe BeefPoint.
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