quarta-feira, 30 de maio de 2012

Concentração danosa


Roberto Simões

Para Péricles Salazar um dos pontos fracos da cadeia produtiva de carne bovina é a deficiência na interlocução entre pecuaristas e indústrias



Recentemente, a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg) promoveu o workshop da cadeia produtiva da carne bovina, o primeiro de uma série de eventos que o Sistema Faemg realizará este ano, dentro do Fórum da Agropecuária Mineira – Realidade e Rumos. Um dos convidados foi o presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), Péricles Salazar. Para ele, um dos pontos fracos dessa cadeia é a deficiência na interlocução entre pecuaristas e indústrias, com reflexos negativos para o consumidor. “Precisamos remar na mesma direção e para isso urge um entendimento entre todos os elos”, sentenciou. Ele tem razão. Temos o costume de cobrar do governo a solução dos nossos problemas, mas às vezes a resposta depende de nós. Muitos deles não podem ser resolvidos por decreto, porém certas decisões governamentais certamente agravam as nossas dificuldades. 

Um exemplo disso é a concentração do setor de frigoríficos, com o apoio seletivo do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a determinados grupos. Esse fenômeno se intensificou nos últimos anos, principalmente no Centro-Oeste. Em Mato Grosso, um só grupo recebeu aportes de R$ 10 bilhões do BNDES, passando a deter 48% de participação no mercado, segundo o Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea). Em 2009, a mesma empresa detinha 14%. Em Mato Grosso do Sul, apenas três grupos respondem por 70% dos abates. 

Com a crise financeira mundial iniciada em setembro de 2008, o problema se agravou, desaguando na quebra de frigoríficos que não tiveram acesso aos créditos oficiais nas mesmas proporções de outros. Em Minas Gerais não é diferente. Temos plantas fechadas, e regiões altamente especializadas na produção de gado de corte, como o Norte de Minas, convivendo com a ausência de frigoríficos habilitados para exportar, e com intermediários se aproveitando da situação. Assim, qual estímulo têm os nossos pecuaristas para se enquadrar nas rígidas normas de rastreabilidade para exportação para a União Europeia (UE), por exemplo, se não recebem diferencial algum no preço do gado que vendem? 

Já há retrocesso no número de fazendas mineiras integrantes do Serviço Brasileiro de Rastreabilidade da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos (Sisbov), que fornece protocolo específico para exportação para países da UE. Recentemente, iniciou-se um movimento de pecuaristas do Centro-Oeste contra a excessiva concentração do setor. Sem concorrência, obviamente, os preços caem. Já estamos organizados em genética, manejo e gestão, mas falta fazer o mesmo no setor da comercialização, para que pequenos e médios produtores não sejam inviabilizados. 

O fortalecimento da cadeia da carne bovina é uma tarefa de todos os setores envolvidos. Quanto à qualidade do produto, o Brasil melhorou muito nos últimos anos, graças ao manejo do gado, cuidados com a sanidade e a genética dos rebanhos, conquistando com isso mercados mais exigentes, interna e externamente. O setor precisa se organizar mais para garantir maior valorização do produto, como ocorre em alguns países vizinhos. Certo é que a concentração de frigoríficos nas mãos de poucos grupos é um processo predatório empreendido por empresas que sufocam as pequenas e médias indústrias, cartelizam o mercado e inviabilizam a atividade de pequenos produtores, que ficam sem opção para vender seu produto. 

Esperamos que esse movimento contra a concentração excessiva ganhe força com a efetiva participação de Minas Gerais, e que órgãos governamentais, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), cumpram sua função de garantir a livre concorrência e o equilíbrio do mercado. Temos que mostrar a força de Minas no setor da carne. O estado tem um rebanho, incluindo de leite e corte, de 23,3 milhões de cabeças. Em 2011, o número de animais abatidos (dentro e fora do estado) foi de 2,3 milhões, dos quais 1,4 milhão de machos e 898,1 mil de fêmeas. Houve redução de 14% em relação ao número de abates de 2010 – dos machos abatidos, 47% eram animais acima de dois anos. O estado tem hoje 30 plantas frigoríficas com Selo de Inspeção Federal (SIF), das quais apenas quatro estão habilitadas a exportar. Que esse movimento anticoncentração iniciado no Centro-Oeste do país ganhe logo fôlego em Minas, que tem gado de qualidade e pecuaristas conscientes de sua força e da importância do seu trabalho para o desenvolvimento de Minas e do Brasil.

Fonte original: Faemg

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