Produtores que adquirem animais para engorda e venda rápida ajudaram a esquentar os remates de outono
Joana Colussi e Vagner Benites
As tradicionais batidas de martelo após o "dou-lhe uma, dou-lhe duas e dou-lhe três" foram estimuladas nesta temporada por um novo perfil de comprador: aquele que investe em terneiros no outono e os revende na primavera, período em que integra as áreas de pastagens com as lavouras de grãos. A prática, que coincide com a entressafra das culturas de verão, ganha força porque une a lucratividade na pecuária com o preparo do solo para o cultivo de grãos.
– Esse é o criador de quatro meses, que compra o terneiro agora e o engorda até setembro, quando vende os animais pelo dobro do preço somente pelo aumento de peso – explica o presidente da Comissão de Exposições e Feiras da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Francisco Schardong.
A atividade reforça a tendência da integração entre lavoura e pecuária e reduz os custos: o produtor prepara o animal e outro finaliza para abate.
– É uma alternativa interessante. O produtor opera como recriador e não como terminador – explica Fernando Furtado Velloso, médico veterinário e consultor da Assessoria Agropecuária FF Velloso & Dimas Rocha.
Produtor de soja há 15 anos em Santa Margarida do Sul, região central do Estado, Nemo de Souza, cultivou 600 hectares do grão no verão. Com a área limpa após a colheita, plantou o azevém, que servirá de pastagens para os terneiros que comprou nesta temporada. Desde que aderiu à rotação entre lavoura e pecuária, Souza costuma adquirir cerca de 800 animais por ano.
– Em um hectare, eu posso colocar uma vaca adulta para abate e ganhar 80 quilos por animal. No lugar dessa vaca, eu consigo colocar dois terneiros e meio, ganhando cem quilos em cada. Tenho lucro maior, e liquidez também – afirma o produtor.
Nesta temporada, Souza arrematou 200 terneiros nas feiras oficiais de outono. A compra menor foi estratégica para tentar obter preços melhores fora do período.
– Os remates acabam inflacionando um pouco o preço do terneiro. Tem muita gente comprando com financiamento e isso acaba aumentando os valores. A ideia ainda é comprar mais 500 terneiros – explica.
Além do lucro que terá com os animais, o produtor também terá ganhos na lavoura, já que a gramínea protege e aduba o solo para o cultivo de grãos na safra de verão.
Angus para a recria
Com a estimativa de que 60 mil terneiros tenham sido vendidos neste outono, em feiras oficiais, pecuaristas gaúchos já teriam comercializado cerca de 5 mil animais a mais do que na temporada passada. A alta foi possível graças a negócios feitos por pecuaristas como José Luiz Marques, 55 anos.Com 600 cabeças de gado geral, Marques resolveu qualificar o rebanho ao investir em novilhas da raça angus. Maior comprador da feira de terneiros da Farsul, realizada em Esteio no mês passado, o criador arrematou 65 animais por R$ 82 mil. Por um dos lotes, com 16 novilhas prenhas, o de maior valor na feira, chegou a pagar R$ 4,46 pelo quilo vivo – A qualidade da raça é muito valorizada no mercado. Nesses casos, vale a pena investir mais. Com as prenhes terei retorno rápido, sem fazer a reprodução – explica Marques, com fazenda em São Francisco de Paula.
Os animais serão criados em campo nativo, onde a pastagem é feita com aveia, azevém e resteva de milho. Ao lado do filho Jonas, 26 anos, o produtor quer aumentar o rebanho com uma raça mais nobre e maior valor de mercado. Com 65 animais comprados, com média de dois anos e meio, fará recria com touros – Depois de fazer a recria planejada, esse gado irá para abate, em cinco ou seis anos – conta o pecuarista.
Na próxima temporada de outono, Marques deve vender os terneiros das novilhas prenhas compradas agora. – Com a venda desses animais, já começarei a ter o retorno do dinheiro investido – disse o criador, que financiou a compra em três anos.
A qualidade dos animais, desde raça, peso, idade e padronização dos lotes, levantou a média das feiras. Foi o caso do remate realizado em abril em Santa Vitória do Palmar, onde a média alcançou R$ 5 pelo quilo vivo de machos e fêmeas.Bons preços, mas abaixo do esperado.
Ainda sem números finais sobre os negócios de outono, o Sindicato dos Leiloeiros Rurais do Rio Grande do Sul (Sindiler) estima que a média não passe de R$ 4,20 pelo quilo vivo. Embora seja superior ao registrado no ano passado – R$ 4,06 – o valor ficou um pouco abaixo do projetado inicialmente.
A grande procura por terneiros antes do período oficial de remates é um dos principais motivos apontados para justificar o desempenho aquém do esperado. – Mesmo antes de iniciar os leilões a procura era enorme (em março). Julgávamos que com financiamentos e a maior organização dos remates o valor médio chegaria a R$ 4,50 – explica o presidente do Sindiler, Jarbas Knorr. Somam-se a isso o atraso nas pastagens em razão de novas áreas de soja e a estabilidade do preço do gado gordo, usado como referência na cotação dos terneiros. Apesar da expectativa frustrada, a remuneração obtida neste ano está longe de decepcionar os produtores. Como o quilo do boi gordo está em torno de R$ 3,30, os atuais R$ 4 pagos por quilo dos terneiros são um valor bastante razoável – explica o consultor Fernando Furtado Velloso, da Assessoria Agropecuária FF Velloso & Dimas Rocha.
Em Lavras do Sul, região representativa na temporada, os negócios cresceram 12%, passando de 5,7 milhões em 2012 para 6,38 milhões em 2013, com a comercialização de 7 mil animais em quatro remates.
ZERO HORA
Nenhum comentário:
Postar um comentário