segunda-feira, 23 de maio de 2011

Quem manda no preço do boi?


Rogério Goulart

Reprodução permitida desde que citada a fonte
Você não está muito longe de acertar na pecuária analisando, em ordem de importância — o abate de fêmeas, os preços do bezerro e o preço da arroba do boi. Parece simples, não é? Mas é simples mesmo.

Toda simplicidade possui elegância. É assim pois, com o tempo de mercado você vai verificando na prática as coisas girando ao redor desses três itens, e esses três itens influenciam um universo enorme de outros fatores que orbitam ao redor deles. Esses três itens são essenciais para o produtor e para o frigorífico planejarem o seus respectivos longo-prazos na atividade, o que irão investir... ou não investir.

Afinal de contas, você quer investir quando a maioria não está investindo. Não faz sentido fazer o mesmo que todo mundo está fazendo. O potencial de ganho (chama-se “alfa” essa ideia) estará sendo diluído por muitos no momento em que todos colherão os resultados. Você quer fugir dessa janela apinhada de gente.

Você quer colher os resultados antes da maioria... ou depois. Lembre-se que a pecuária é imensamente maior, enormemente mais lenta e mais regional que a gente tem o costume de acreditar ou esperar.

Essa é a ideia central por trás dos contratos futuros. Fazer agora o que se deve fazer antes de todo mundo.

É claro, “fazer agora” é simplificar muito a coisa. Na realidade ninguém irá te dizer a hora correta de antecipar o que você tem que fazer. Você terá que fazer por você mesmo. É o que a gente faz aqui nessas linhas — escrevo para ordenar os pensamentos e com isso ajudar nas negociações. O intuito é tentar buscar o valor intrínseco, real, dos produtos pecuários... não preços, puramente.

Quando achamos uma diferença muito grande entre preço e valor... as tais distorções, como gosto de chamá-las... bom... acho que quem acompanha há alguns anos esses textos sabe o que quero dizer. Essa é a razão e origem da Carta Pecuária.

Com muita humildade, a gente acompanha uma lista bem grande do que se tem para acompanhar sobre pecuária, caro leitor. Acredito que vocês também acompanham isso no dia-a-dia. É esse o “universo” a girar ao redor daqueles três itens que comentei acima. Dólar, exportações de carne, exportações de boi em pé, exportações dos outros países, rastreabilidade, taxa de reposição, frango, atacado, inflação, ouro, milho, soja, escalas de abate... a lista vai longe... mercado futuro, mercado de opções, volatilidade, renda, emprego, diesel, ações dos frigoríficos em bolsa, clima, tendências em nutrição do gado, confinamento, melhoria genética, disposição de carne nas gôndolas nos açougues, supermercados médios, grandes e Premium, e por aí vai.

Porque estou dizendo essas coisas? Porque nesses vinte anos acompanhando boi não encontrei nada mais poderoso para mover os mercados e que influencia a direção da pecuária que o abate de fêmeas, o preço do bezerro e o preço da arroba do boi.

São tão importantes que até cunhei duas frases para melhor explicar o que essas coisas significam.

Sobre o abate de fêmeas: “Quem Manda no Boi é a Vaca.”
Sobre o preço do bezerro e do boi: “O Teto do Boi é o Bezerro.”

Acho isso tão importante que escrevo um texto completamente diferente chamado “Carta Pecuária de Longo-Prazo” somente tratando desses temas mais abrangentes. Escrevo apenas quatro edições por ano desse texto. Ele é publicado trimestralmente pela Scot Consultoria.

Daqui a uns dias sairá a edição desse trimestre.

Essa semana, vamos analisar algumas variáveis que há tempos não aparecem aqui.
Vamos falar sobre a arroba em dólares, a arroba em ouro, o diferencial de base entre o Brasil Central e São Paulo, a posição dão pessoa física na bolsa e o Put/Call Ratio.

Lá atrás, em 2002, a arroba valia 13 dólares em seu pior momento. Seu melhor momento foi ano passado valendo 69 dólares — uma alta de impressionantes 430% em dez anos!

A arroba nesses valores tem prejudicado as exportações? Os frigoríficos dizem que sim, mas o clamor deles soa estranho já que o euro (gráfico) e outras moedas estão se valorizando em relação ao dólar.

Dentro dessa linha de comparar a arroba em outras moedas, vamos falar da arroba cotada em ouro.
Fazem 10 anos que não mais comparo o boi em dólares, mas sim em ouro. Ou seja, meu indicador da atividade é o ouro.
Porque? Bom, o dólar nessa última década vêm perdendo seu poder de compra e reserva de valor. Hoje, guardar uma poupança em dólares é ruim.

Os volumes monstruosos de emissão de moeda que o FED fez desde a bolha da Nasdaq em 1999, até o estouro da bolha especulativa imobiliária em 2007, e subsequentemente a crise de crédito mundial, tornaram o ato de guardar dólares um péssimo negócio.

Se for somada, a quantidade de moeda nesses últimos quatro anos emitida equivale à soma de toda emissão de moeda feita pelo banco desde que ele foi criado em 1913.

É realmente simples. Mais moeda emitida, no seu devido tempo quando esse dinheiro chegar no mercado, maior o potencial de inflação. É o que vêm ocorrendo mundo afora.

O ouro é o antídoto à essa emissão de moeda. É uma forma de resguardar o poder de compra, mais ou menos parecido com o que os pecuaristas fizeram no Brasil na década de 80 com a inflação galopante.
E a arroba vem caindo em ouro.

Guardar parte em ouro o dinheiro do boi tem sido melhor do que simplesmente deixar dinheiro no banco. Sei disso porque é isso que temos feito nessa última década.

Seguindo em frente, o diferencial de base entre SP e o Brasil Central hoje gira ao redor de um desconto de 11%. Já foi pior. No final de 2010 essa conta estava girando com um desconto de 14%.

Melhorou de lá para cá, certo, mas mesmo assim os 11% de hoje está abaixo do desconto médio de 9% dessa mesma época do ano passado.

Ou seja, a oferta de bois está melhor hoje que estava ano passado? Segundo o diferencial de base, é essa a mensagem. Mas não dá para dizer se isso representa um fator altista ou baixista para o mercado. Teremos que esperar para ver.

Por último, deixe-me sobre o indicador Esalq/BVMF e a posição líquida das pessoas físicas na bolsa. No momento em que o pessoal estava mais otimista, achando que a arroba ia subir, foi o momento em que ela começou a cair.

A posição líquida de PF na bolsa está se tornando no boi um exemplo clássico de indicador contrário ou reverso? É o que parece. Quando está comprada no extremo (otimista, perto dos 50%) foram bons momentos de venda. Quando está vendida no extremo (no período, perto de 0%), foi boa hora de comprar.

O que tem a ver pessoa física na bolsa com os preços da pecuária? É uma observação de mercado. Até porque na pessoa física da bolsa não tem só produtor. Pelo contrário. Tem muito especulador, ou seja, são agentes que arbitram os preços — no sentido benigno da palavra.

“Pessoa Física” tem outras preocupações e ocupações e normalmente não acompanham o mercado minuto-a-minuto e nem teriam motivos para fazer isso.

Mas os outros participantes da bolsa acompanham, como “pessoa jurídica” e “investidor institucional”.
Para a pessoa física os movimentos funcionam no boca-a-boca, um vai falando para o outro. Daí existir essa tendência da posição ficar exagerada no final dos movimentos. Mas isso é realidade em qualquer mercado, ok? Não é só no boi.

É difícil competir com um cara que fica com quatro monitores de computador abertos ao mesmo tempo e paga uma fortuna por mês em terminais de cotação on-line, ao vivo, dos preços. Vai por mim, já trabalhei em bolsa e sei como é isso daí.
Então, a ideia é a seguinte: fique sempre alerta. Sempre alerta com os próprios sentimentos, principalmente.

Se você se sentir dentro da febre de alta ou de baixa... não é fácil perceber isso, mas se você se ver dentro da febre e “torcendo” tanto de alta quanto de baixa, e principalmente a coisa se torna mais grave e urgente quando você e seus amigos estão todos pensando do mesmo jeito (pense Twitter), provavelmente o movimento está popular demais e tende a virar.

Cuidado com as coisas populares no mercado — normalmente elas já estão precificadas.
Existe uma maneira de medir esse sentimento altista e baixista no mercado? Existe sim, ele é a Razão entre as Opções de Venda e de Compra de boi gordo. Em inglês, PUT/CALL Ratio. Essas opções de boi gordo são negociadas na BM&FBovespa.

De janeiro até abril o sentimento era altista, mas o mercado não concretizou esse sentimento. Foi só a arroba começar a cair que o sentimento virou de altista para baixista, e estamos no pico de curto-prazo desse sentimento.

Normalmente o Put/Call Ratio é um indicador reverso, ou seja, quando está baixista é hora de comprar e vice-versa. No boi isso talvez ainda não funcione 100% ainda, pois o uso do mercado de opções é recente mas está crescendo muito, então estamos caminhando para que o Put/Call Ratio se torne mais um indicador que a gente pode usar. Que bom.

A edição de hoje é isso, caro leitor. Uma sobrevoada em algumas ferramentas e variáveis que faz tempo que não atualizamos aqui, mas que dou muita importante e sugiro você também se ligar a eles com mais frequência. Ajudam no dia-a-dia e ampliam nossa percepção do mercado.

Fonte: Carta Pecuária

Nota da Bigma Consultoria: O texto de Rogério Goulart, da Carta Pecuária, publicado nesse espaço, foi resumido e os gráficos suprimidos. Acesse a análise completa e com os gráficos no site da Carta Pecuária
Todos os dados apresentados no texto são reforçados com gráficos pelo autor na versão completa.

FONTE: BIGMA CONSULTORIA

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