terça-feira, 1 de março de 2011

Comentando, filtrando e refletindo

Sob o ponto de vista único do mercado, a arroba está cara ou barata ultimamente, caro leitor?

Olhe o gráfico abaixo, o complexo boi/carne. O mercado está em estabilidade desde a queda de novembro. Passamos o final do ano, as férias escolares e o início das aulas, estamos entrando no carnaval com o boi e a carne mais ou menos nos mesmos valores que estavam em dezembro.



Isso é alta? Acho que não. Isso é baixa? Também acho que não. Isso é estabilidade. É a oferta atual dando conta de atender a demanda, seja ela interna ou externa. Não dá muito para fugir desse tipo simples de análise quando as únicas variáveis que se prezem em commodities são a oferta e a demanda, atual e futura.

A situação atual é essa que está acima no gráfico. E para frente, o que a gente pode esperar? O sentimento que tenho absorvido, do pessoal que vende animais e dos compradores destes animais, quando se pergunta o que eles esperam para frente, torcem o nariz e a boca, dão de ombros como quem diz: “Puxa, está tão firme agora, em uma época deveria já estar caindo... Não sei de mais nada.”

Mas aí a gente pede um pouco mais de detalhes e aparecem as medidas. Mercado externo demandando mais carne, mercado interno absorvendo nesses valores atuais, oferta atrasada do Mato Grosso do Sul e, pelo que pude levantar, dos outros estados também, em menor grau. Vai mais... Preços de reposição saíram de 1250 para 1350 reais, o boi magro de dezembro para cá fazendo o invernista segurar o gordo para melhorar a troca, preço do milho e insumos de um modo geral subiram bastante, assustando, e por aí vai.

Agora estamos em plena época de quem irá confinar esse ano se mexer. Comprar seus insumos, ver a oferta de boi magro, se programar, se organizar. O que tenho escutado é em aumento nos pedidos e consultas com intenção de confinar esse ano ou aumentar a quantidade de animais em relação ao ano passado. O que você tem visto na sua região?

E os custos totais de produção desse animal? Será competitivo numa arroba ao redor de 105 reais à vista em outubro? Quero dizer, valerá a pena ou o pessoal vai peitar, como fizeram o ano passado?

Realmente estou ainda na fase de escutar o que a turma está comentando, filtrando e refletindo um pouco as conversas que escuto. Meu filtro é o seguinte: fica difícil se segurar na cadeira depois de uma super entressafra como a que foi em 2010.

Deixe-me contribuir aqui nessa discussão, não sobre o confinamento em si, mas no mercado pecuário como um todo. De todas as coisas que irão eventualmente acontecer em 2011, uma você pode ter quase certeza que irá ocorrer. O abate total de animais irá aumentar.

Não sei se você chegou a ler a Carta Pecuária de Longo-Prazo, que escrevi no final de janeiro, início de fevereiro. Lá mostrei que o abate nacional de gado em 2010 aumentou 8%, como você pode ver aqui abaixo.



Na minha humilde opinião, espero o abate desse ano aumentar pelo menos nos mesmos níveis do ano passado, mais ou menos em linha com o que ocorreu nessa fase do ciclo pecuário anterior, entre 2001 e 2003.

O mercado interno e as exportações terão condições de absorver esse acréscimo de carne? Isso é fácil. Sim, se a inflação comer parte do valor da arroba.

É o que está acontecendo. Comentamos em janeiro sobre inflação, agora me fevereiro a inflação está em todos os jornais e revistas. Realmente isso é sério, pois até o governo se pronunciou dizendo que o mercado exagera nas suas perspectivas de inflação. Naturalmente, quando o governo diz uma coisa, a gente tem que acreditar no contrário do que ele diz, então até o governo está preocupado com isso.

E com novas rodadas de aumento no salário mínimo acima da inflação e com o mundo de investimentos que terão que ocorrer até a Copa do Mundo e Olimpíadas, foi a explosão imobiliária Brasil afora, é batata novas pressões inflacionárias no horizonte.

O alerta que temos que ter sobre isso é que o mercado futuro, especialmente para a entressafra está precificando uma arroba com muita inflação e acreditando que a oferta no segundo semestre será muito maior que o que ocorreu no ano passado.

A gente conversou algumas vezes sobre esses contratos da entressafra, especialmente o contrato de outubro. Lembram-se quando começamos a falar nele quando ele estava ao redor de 96 reais? Pois bem, observe a curva dos contratos futuros quando a gente joga um pouco de inflação em cima dos preços. Lembre-se que hoje o contrato de outubro vale ao redor de 106 reais, ok?



Observe como os preços, trazidos para hoje, ficam abaixo do mercado físico atual. Os 106 reais para outubro valem míseros 99 hoje. E isso, sem descontar o funrural ainda! Essa é a forma oculta de como os preços da arroba caem para o produtor sem que ele perceba. Então, se quiser mesmo fazer contas para a entressafra, use uma arroba ao redor de 95 reais para SP à vista sobre os seus custos de hoje. Daí você terá uma noção mais precisa de sua rentabilidade real, pois estará corretamente levando em conta a inflação no período.

Será que gosto desse gráfico acima? Não, realmente não. Como disse em janeiro, ainda estou com a impressão que o contrato de outubro está com um viés altista, apesar de que momentaneamente uma arroba ao redor de 106 reais está tecnicamente precificada de forma correta, como comentamos uns dias atrás.

Mas vamos acompanhando. O texto de hoje está em aberto, sem conclusão até porque na minha cabeça, o cenário para o segundo semestre ainda não está claro. A rentabilidade da engorda aumentou aqui, sem dúvida, favorecendo o aumento dos abates, mas a rentabilidade terá que se manter boa para compensar os últimos dois anos e acréscimo brutal dos preços da reposição e, o mais importante, ela terá que se manter boa (acima dos títulos atrelados à inflação do governo), para tirar das gavetas novos projetos de engorda.

Vamos conversando. Gostaria de saber sua opinião a esse respeito.

FONTE: SCOT CONSULTORIA - AUTOR ROGERIO GOULART

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