*Paulo de Castro Marques
A primeira reação do consumidor ao se deparar com os elevados preços da carne bovina é culpar o varejo. Mas desta vez o supermercado não tem culpa – pelo menos não toda.
Os aumentos seguidos da picanha, maminha e alcatra do churrasco decorrem da boa e velha lei de mercado. No momento atual, a demanda está aquecida e a produção não tem condições de evoluir.
O consumo está quente porque o brasileiro tem mais recursos em mãos e, com isso, quer a carne bovina mais vezes por semana no seu prato. Simples assim. Estudos de economistas de várias partes do mundo apontam para o aumento da procura por carne vermelha sempre que há mais dinheiro circulando. Ou seja, se a economia está aquecida, é sinal de maior procura por carne. Isso ocorre em todos os países em expansão, os emergentes. No Brasil não é diferente.
Ocorre que o aquecimento da economia nos últimos dois ou três anos pegou a cadeia da carne bovina em um momento especial. A atividade vive historicamente períodos de altos e baixos da produção. O atual é de baixa oferta.
Os fatores são vários. Um dos mais relevantes é o elevado abate de fêmeas que atingiu patamares próximos de 50% em alguns momentos dos últimos anos. Isso significa que os frigoríficos chegaram a trabalhar com volume equivalente de machos e fêmeas, quando o percentual ideal está na faixa dos 30% de vacas.
Esse crescimento do abate das fêmeas ocorreu – e alguns analistas defendem que ainda ocorre, porém em níveis um pouco inferiores – por diversos motivos. De um lado, o pecuarista convivia (entre 2004 e 2009, especialmente) com baixos preços da arroba do boi gordo. Assim, não se motivava a segurar as matrizes pra reprodução. A estratégia era de sobrevivência. De outra parte, os frigoríficos nunca tiveram tantos contratos para exportação. Assim, conseguiam atender aos pedidos adquirindo matéria-prima (gado) por valores baixos.
O consistente e crescente aumento do consumo doméstico e o fortalecimento do real frente ao dólar desequilibraram essa balança. Os frigoríficos passaram a valorizar a demanda interna, além de se manter ativos externamente. Porém, a produção estava reduzida por conta dos motivos já expostos.
O resultado é a carne bovina no varejo pressionando os índices inflacionários, o que é ruim para o País como um todo e arranha a imagem da atividade.
Como evitar essa gangorra? Defendo uma política clara, que permita aos pecuaristas o planejamento e o investimento a médio e longo prazos. Sem nenhuma segurança para segurar as fêmeas na fazenda, a saída é vendê-las. Porém, a pecuária é uma atividade de ciclo longo. São necessários pelo menos dois anos para colocar um animal no peso ideal para abate.
O pecuarista prefere estabilidade a ganhar muito em um momento e perder em outro. Para que isso ocorra é preciso ter mecanismos para sua proteção. Linhas de crédito especiais para determinados momentos, como a redução drástica e rápida dos preços do boi gordo, por exemplo, podem ser um caminho. Mas certamente há outros e as autoridades precisam estar atentas para isso. Até porque o panorama atual ainda deve se manter por um bom tempo.
* Empresário e pecuarista, é proprietário da Casa Branca Agropastoril, especializada na criação de gado Angus, Brahman e Simental sul-africano, e acaba de assumir a presidência da Associação Brasileira de Angus (ABA).
FONTE: Agrolink
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