A cena parecia extraída de um filme épico. Quase 17 mil bois ou, em números mais precisos, 16.459 bois sendo embarcados no navio Ocean Driver com destino ao Oriente Médio, numa operação gigantesca efetuada no Porto de Vila do Conde, em Barcarena, ontem pela manhã. Serão 12 dias de viagem até que o mercado do Líbano receba as 6.200 toneladas bovinas oriundas do sul do Pará.
A empresa responsável pela proeza foi a italiana Welard do Brasil Agronegócios, que há dois anos se instalou no Brasil depois de meio século na Itália e trinta anos na Austrália. Foi o maior transporte de gado vivo já feito no Estado. Uma estrutura especial foi montada para que a operação fosse viabilizada.
“Estamos utilizando a maior embarcação para transporte de bovinos e ovinos do mundo”, diz o diretor da Welard, Henry Steingiesser. De fato, é um navio tão impressionante que foi tema de um documentário do canal de TV Discovery Channel. O Ocean Driver possui 10 andares, como se fosse um edifício, seis deles acima do nível do mar. A capacidade de transporte pode chegar a 20 mil bovinos.
A ideia é focar novos mercados para o gado paraense. Atualmente as exportações de bovinos vivos representam a quarta maior exportação do Pará, em um cenário brasileiro que cresceu quase 30% nos primeiros sete meses de 2010, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). “Estamos focando a abertura de novos mercados, como o venezuelano e o do Líbano. Com o desenvolvimento sanitário animal, outros mercados poderão ser abertos para incrementar a exportação”, diz o diretor da Welard.
É um mercado onde o Pará tem voz ativa. Nos últimos dois anos o estado foi o responsável pelo embarque de mais de 95% do gado vivo exportado pelo Brasil, segundo o Ministério da Agricultura, e cada vez mais esta atividade tem ganhado peso na economia do estado. Pode-se dizer que, em faturamento, as exportações de bovinos vivos do Pará já representam quase 7% da pauta de exportação do estado, só ficando atrás do setor de minérios.
Não à toa os cuidados para o embarque desses animais têm sido cada vez mais rigorosos. A carga embarcada ontem para o Oriente Médio chegou a ser embargada, mas a empresa comprovou a origem legal do gado e conseguiu a concordância do Ministério Público Federal e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para exportar os bois.
“A Welard se instalou no Pará depois da assinatura do Termo de Ajuste de Conduta entre o Ministério Público do Pará e os produtores. Mas fez tudo de acordo com o que estabelece o TAC. Posso dizer que nunca uma exportação foi tão fiscalizada”, diz o veterinário Roberto Lima, 44 anos. O veterinário refere-se ao compromisso assinado em 2009, com a exigência de que a carne, para ter a comercialização liberada, seja proveniente de fazendas legalizadas do ponto de vista ambiental, social, trabalhista e fundiário.
Esse será apenas o primeiro embarque. A Welard possui uma frota com quatro navios, todos desenvolvidos para o transporte de passageiros de quatro patas. Dois entraram em atividade em 2010 e dois estão sendo construídos na Coreia do Sul e devem entrar em operação no final de 2012.
Passava pouco das 7h quando o navio desatracou de Vila do Conde. Em menos de meia hora, já se tornava apenas um pequeno ponto no horizonte. A velocidade da embarcação é outra característica. No oceano, pode atingir até 19 nós, algo em torno de 35 km por hora. “É um navio rápido”, orgulha-se o diretor, enquanto acenava para a tripulação.
Setenta e duas horas de ação ininterrupta no embarque
No embarque de quinta-feira dois recordes foram quebrados. Nunca se havia exportado um volume tão grande de cabeças de gado de uma só vez e em apenas 24 horas foram embarcados 6.800 bovinos, quando a média costuma ser a metade disso.
“É uma operação logística complicada”, diz o agente Nelson Jaques, da empresa Amazon Log, responsável pela parte prática do embarque. Foram usados 50 trabalhadores portuários 24 horas por dia, durante três dias.
Logística complexa também foi a do transporte do gado do sul do Pará até o porto em Barcarena: foram 750 caminhões. São jovens bois da raça nelore e nelorado. O gado jovem é mais apreciado pelos povos muçulmanos, que gostam da carne com tonalidades mais rosadas do que escuras, como é hábito no Brasil.
Durante os doze dias cruzando o oceano, o cuidado com a carga é dobrado. “Toda a ração é distribuída automaticamente sem contato humano. A água é dessalinizada do próprio oceano, ou seja, não precisamos carregar água. Toda a tripulação é treinada para esse tipo de transporte”, diz Steingiesser. São 80 tripulantes e dois veterinários a bordo do navio.
RITUAL DA COMIDA
Para os islâmicos, o abate do boi ou do frango é um ato religioso e deve ser feito apenas pela degola, para garantir a morte instantânea do animal. Todos os procedimentos devem ser feitos por um muçulmano praticante, treinado especificamente para essa função.
CONTROLE
Por conta disso, três veterinários foram enviados do Egito e desde dezembro fiscalizam todos os passos para que o transporte seja feito da forma adequada. “Eles são extremamente rígidos”, diz o veterinário Roberto Lima.
FONTE: Diário do Pará
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