Esses fatores explicam por que os supermercados estiveram mais cheios no ano passado, com o público em busca de carne de primeira. Mas já houve época recente de vacas magras. Guilherme Bellotti de Melo, analista do Rabobank, instituição voltada para a indústria brasileira de alimentos e para o agronegócio, lembra que entre 2004 e 2006 os preços da carne estavam tão em baixa que mal cobriam os custos. Para se ter uma ideia, em 2006, a média da arroba (15 quilos de carcaça) era vendida a R$ 52,76, segundo dados da BM&F. Mas em outubro de 2010 chegou a R$ 118 e os contratos futuros para outubro de 2011 continuam fechados acima de R$ 100.
Há quem suspeite de uma grande bolha com a alta das commodities, entre elas a carne, com as negociações em mercado futuro na BM&F. Mas o analista da BeefPoint, André Camargo, avalia que essa alta não é resultado deste tipo de especulação na bolsa. “O volume de negócios até caiu”, argumenta. A especulação, na verdade, ocorreu em outro momento, quando havia pouca demanda e os preços despencaram. “Durante a baixa dos preços, houve uma grande redução do rebanho, com abate das matrizes na tentativa de equilibrar os preços. Agora, a alta é provocada pela escassez”, diz Bellotti de Melo, do Rabobank.
Coordenador da CFM, maior produtora de touros nelore do País, Luis Adriano Teixeira lembra que a pecuária sempre exibiu ciclos de alta e baixa e que, neste momento, há uma retenção de matrizes nas fazendas. “O bezerro desmamado valia R$ 350 em 2005. Hoje cada animal custa R$ 740, porque não tem para vender”, conta Teixeira. Enquanto o frango leva em média 50 dias para ficar pronto para o abate, o processo de fertilizar o gado, desmamar o bezerro e engordar o boi no pasto exige três anos. Por isso, o preço da carne não voltará tão cedo aos tempos de bonança. O pecuarista Paulo de Castro Marques, presidente da Associação Brasileira de Angus, diz que no período de entressafra, quando a seca começar a prejudicar as pastagens, a partir de abril, o preço vai subir ainda mais. “Em 2010, os frigoríficos conseguiram repassar os preços para o consumidor. Não houve perda de margem”, diz o analista de renda variável do segmento de alimentos da Fator Corretora, Renato Prado. “O preço subiu e a população se dispôs a pagar mais”, conclui.
Claro que existe um teto-limite para o preço da carne. Afinal, o consumidor sempre pode substituir o bife de cada dia por carne de frango ou porco, mas essas alternativas também estão em alta porque os grãos e a soja, que respondem por 70% da ração dos animais, não param de subir. A soja e o milho acumulam alta de dois dígitos na bolsa de Chicago, por causa dos escassos estoques, que já são os menores dos últimos 15 anos. A solução seria aumentar a oferta de carne. Mas, segundo o pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP, Sérgio de Zen, os investimentos do setor pecuário são insuficientes para cobrir o mercado atual. Diante da alta dos preços, resta à população esquecer o filé mignon, comer menos picanha e mais contrafilé e alcatra.
Além do desequilíbrio do mercado nacional, a demanda no mundo inteiro por carne bovina cresceu. E apesar de o Brasil consumir 80% da carne que produz, sofre influência dos problemas nos países concorrentes, que também estão no limite de sua capacidade de produção, segundo André Camargo, da Beef Point. Outro agravante: as nações em desenvolvimento aumentaram suas compras e os países desenvolvidos começam a se recuperar. Os EUA, por exemplo, retomaram as importações de carne bovina congelada, cozida e processada do Brasil, que estavam suspensas desde meados do ano passado. “Cumprimos todas as exigências. É uma vitória”, diz o ministro da Agricultura, Wagner Rossi. Pode ser. Mas, com as exportações em alta, dificilmente o preço da carne vai parar de subir.
FONTE: Revista Isto É
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